Em Lispectorante, a cineasta Renata Pinheiro toma como ponto de partida para a ideia central da sua história a presença da estátua em homenagem a escritora Clarice Lispector presente em Recife na proximidade daquela que foi a residência da autora quando chegou ao Brasil. Ao olhar para o interior do imóvel por uma fresta, a artista plástica Gloria Hartman, interpretada por Marcélia Cartaxo, tem seu atribulado cotidiano tomado por consideráveis doses de ludicidade.
O longa de Renata Pinheiro dedica-se a um olhar para sua protagonista, uma mulher com uma certa dificuldade para lidar com o lado mais prático e "duro" da vida, usando a fantasia como instância de sobrevivência. Algumas vezes, a estratégia de Glória é uma fuga e em outros momentos acaba sendo certeira no intento da personagem, conduzir a vida à sua maneira. Na verdade, Lispectorante é um olhar para Recife e toda a mágica que permeia o seu centro, repleto de histórias da passagem de alguns artistas por aqueles espaços, de Carmen Miranda à própria Clarice Lispector, o que transforma a cidade em um lugar mágico. Mais do que a personagem, isso, muitas vezes, passa a ser o tema central do longa de Renata Pinheiro.
Lispectorante ganha muito com a presença dominante da atriz Marcélia Cartaxo, retomando aqui sua relação com a escritora responsável pela obra literária que projetou sua carreira no cinema através de A Hora da Estrela de Suzana Amaral, filme que lhe rendeu o prêmio de melhor atriz no Festival de Berlim nos anos 1980. Cartaxo está formidável como Gloria, uma mulher que parece viver em uma voltagem diversa do restante da humanidade. Em meio a resoluções de conflitos familiares que envolvem doença e divisão de patrimônio, Gloria acaba se apaixonando por um artesão de rua chamado Guitar, uma autêntica aventura amorosa.
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