Em Parthenope: Os Amores de Nápoles, o cineasta italiano Paolo Sorrentino (A Grande Beleza) está às voltas com uma sorte de temas já inspiradores para diversos realizadores cinematográficos. A beleza e a juventude são o ponto de partida da elocubração audiovisual do diretor protagonizada por uma jovem cujo nome dá título ao filme e é a inspiração de uma lenda mitológica que dá origem à cidade habitada pelos personagens dessa história.
Tudo em Parthenope parece enquadrá-lo no conceito de "male gaze", aquele olhar cinematográfico que registra personagens femininas como objeto de desejo e não como sujeito das suas próprias histórias. A princípio Parthenope e a atriz Celeste Dalla Porta parecem estar à serviço dessa ideia no drama já que a protagonista do filme está sempre sob o escrutínio dos personagens masculinos, alguns deles, homens mais velhos, que a tratam como inspiração, a cobiçam sexualmente ou invejam a sua beleza. No entanto, o realizador italiano parece subverter esta lógica quando, a partir da tragédia que toma conta da família da protagonista, ela protagoniza uma jornada de amadurecimento que, por tradição, costuma ser atravessada por jovens homens nas telas.
Em Parthenope, Sorrentino quer representar na tela todo o ciclo de amadurecimento de uma jovem mulher, empreendendo para tanto uma jornada interna representada por imagens e situações criativas construídas pelo filme. Juventude, culpa, repressão, realização e sexualidade estão entre os tópicos discutidos pelo longa na medida que Parthenope se transforma, amadurece e faz suas escolhas de vida.
Apesar da empatia do diretor com a causa feminina, fica latente que Parthenope acaba sendo refém de uma dubiedade. Há da parte de Sorrentino um esforço empático de acessar a alma feminina e evitar reduzir a protagonista a sua aparência, realizando até mesmo uma provocação sobre esse movimento comum do cinema realizado por homens décadas atrás. Contudo, toda a construção estética do filme faz com que Sorrentino entre em contradição o tempo todo: sua fotografia milimetricamente bem cuidada, a forma como a câmera enquadra a atriz Celeste Dalla Porta como se, mesmo em sua versão menos glamourosa, estivesse sempre em uma grande campanha publicitária de perfume importado. Parthenope quer empoderar mulheres, mas incorre o tempo todo no mesmo viés de sempre.
Além da "escorregada" no tratamento do tema, Sorrentino parece sempre muito auto-indulgente, fascinado pela sua própria capacidade de produzir planos belíssimos e explorar na máxima potência a junção das suas imagens com uma trilha sonora sempre muito presente para desviar a atenção do espectador. O apuro estético surge sempre para disfarçar os problemas de tratamento do tema do filme ou para impactar sensorialmente o espectador e não para conferir organicidade entre esses recursos e a narrativa do filme. No fim das contas, Parthenope é essa contradição ambulante, uma bela miragem que nunca esclarece o espectador a respeito das suas reais pretensões em seu estudo antropológico pela perspectiva feminina.
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