O Melhor Amigo marca o retorno aos cinemas do diretor Allan Deberton depois de Pacarrete, longa que lhe rendeu oito prêmios no Festival de Gramado de 2019. Desta vez, Deberton aposta em um musical romântico LGBT ambientado no litoral nordestino representado pela praia de Canoa Quebrada com uma trilha repleta de clássicos populares dos anos 1980 e 1990.
O longa conta a história de Lucas (Vinicius Teixeira) um jovem arquiteto incerto sobre os rumos do seu atual relacionamento com o namorado Martin. Diante desta crise amorosa, Lucas resolve dar um tempo e viaja para Canoa Quebrada a fim de reencontrar um antigo amor do passado, o escorregadio Felipe (Gabriel Fuentes), um guia turístico que nas horas vagas trabalha como um dos garçons descamisados de uma boate gay local, além de prestar "favores sexuais" a quem eventualmente se interesse pelo seu perfil e seus dotes.
O Melhor Amigo é um musical que não tem muito receio de fazer uso de todos os recursos do gênero em larga escala. Ao mesmo tempo, Deberton faz uma comédia romântica que "conversa" com todos os clichês de longas desse nicho. É uma aposta singular na cinematografia brasileira, infelizmente pouco explorada, e o diretor faz uma ótima incursão nas duas frentes.
A direção dos números musicais de O Melhor Amigo é cheia de energia e personalidade, com performances vocais e coreográficas bem executadas do seu elenco, além de utilizar muito bem canções conhecidas em prol da história que está sendo contada. Entre as canções usadas no filme estão clássicos como "Amante profissional" do Herva Doce e "Escrito nas estrelas" de Tetê Espíndola.
Como comédia romântica, O Melhor Amigo também é bem-vindo no âmbito do cinema LGBT, com representações para o grupo que fogem a realidade sul e sudeste do país, ainda que aqui e ali reforce um imaginário sobre homens gays com referências óbvias que definitivamente não contemplam toda a comunidade. Ainda assim, a narrativa solar que não problematiza muito algumas experiências acaba representando um frescor na nossa cinematografia quando o caminho dominante acaba sendo o dos dramas sociais carregados de conflitos psicológicos bastante complexos, por vezes de final trágico ou pessimista. O cinema LGBT também precisa de narrativas escapistas como O Melhor Amigo. A diversidade sempre é bem-vinda na forma das histórias.
O elenco também oferece boas interpretações. Vinicius Teixeira e Gabriel Fuentes constroem uma tensão sexual cheia de faíscas ao longo do filme, interpretando figuras de temperamentos opostos, com Lucas como um rapaz mais acanhado e inseguro e Felipe sempre performando o tipo sedutor e liberal, quando, na verdade, está sempre fugindo de um aprofundamento nas suas relações. Há ainda ótimos coadjuvantes, como Deydianne Piaf, a estrela da boate gay do longa que está nos últimos dias das suas apresentações na casa de shows, e Léo Bahia como Martin, o namorado pegajoso de Lucas.
Trazendo participações de Gretchen, Mateus Carrieri e Claudia Ohana, O Melhor Amigo ainda tem essa verve nostálgica representada não só na música, mas nesse panteão de ícones para a comunidade LGBT brasileira. É um longa que captura referências pop nacionais com um orgulho que pouco se vê, infelizmente, no nosso cinema, ainda muito elitista como expressão em função de escolhas criativas elementares, como o gênero cinematográfico. Divertido, solar, com muito potencial para ser popular, mas que, claro, precisa de um bom boca-a-boca para efetivar esta vocação, O Melhor Amigo tem uma execução acertada na maior parte do tempo, ainda que seu desfecho opte por soluções reiterativas de outras narrativas do gênero, mas traz um inegável frescor ao calendário de estreias do cinema nacional.
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