Kasa Branca acompanha a história de Dé, um jovem negro da periferia do Rio de Janeiro interpretado por Big Jaum. O rapaz mora sozinho com a avó vítima do Alzheimer em estágio muito avançado e enfrenta todos as complicações por ter assumido cedo muitas responsabilidades em sua vida, como a maioria dos jovens de periferia da sua idade. Dé conta apenas com a ajuda dos seus amigos para enfrentar os desafios que representarão os últimos dias da sua avó Almerinda, vivida pela sempre competente Teca Pereira.
Kasa Branca é um filme que carrega consigo a responsabilidade de representar o cotidiano de uma juventude periférica carioca e cumpre esse objetivo com muita eficiência e sensibilidade. O cotidiano de Dé e seus amigos é marcado pelas dificuldades inerentes de se viver uma realidade social com limitações financeiras, mas jamais o filme de Luciano Vidigal retrata aquele cenário com um tom mais carregado, excessivamente calcado em estereótipos. Apesar das dores da segregação social e do racismo, os jovens de Kasa Branca encontram focos de diversão em seu cotidiano, tornando o filme um retrato leve e bem-humorado daquela realidade.
O longa dirigido e roteirizado por Luciano Vidigal (do documentário Cidade de Deus: 10 anos depois) também sabe buscar a emoção quando constrói a jornada de luta do seu protagonista. Big Jaum entrega uma performance extremamente sensível como um jovem que assume responsabilidades muito cedo e tem um carinho comovente pela única pessoa da sua família que lhe dedicou algum tipo de afeto. Apesar do amor que dedica a avó, algo dado por Dé sem qualquer tipo de cobrança, é claro que tamanha responsabilidade faz aflorar algumas faltas na vida do rapaz. Dé, evidentemente, "queimou" muitas etapas naturais e amadureceu às custas de algumas dores. Nesse contexto, Jaum interpreta esse protagonista como um jovem doce que guarda algumas mágoas em decorrência do abandono parental representado pela ausência do pai vivido por Babu Santana.
Não é só Big Jaum que merece elogios, todo o elenco de Kasa Branca está muito bem. Podemos destacar ainda, claro, a interpretação de Teca Pereira. A atriz evita que a condição de saúde de dona Almerinda a transforme em uma presença inexpressiva ao longo do filme. Há momentos nos quais a personagem recobra a lucidez e, ao lado de Jaum, Teca Pereira é capaz de levar o público a lágrimas. Há também uma ótima participação de Roberta Rodrigues interpretando a mãe de um dos amigos de Dé, uma gerente de academia que é alvo de uma paixonite do protagonista.
A princípio, o grande número de personagens e de tramas paralelas em Kasa Branca pode gerar a suspeita de um filme marcado pelo hiper foco, mas logo o longa de Luciano Vidigal demonstra a que veio, revelando uma história poderosa sobre herança familiar e como gerações futuras podem romper alguns ciclos de ranhuras familiares com muito afeto e consciência das suas origens. Com Kasa Branca, Luciano Vidigal consegue mostrar uma periferia carioca repleta de problemas, mas habitada por pessoas cheias de desejos, histórias de lutas e elos de amizade que suprem faltas familiares.
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