Depois de terem colaborado com A Dona do Barato, o diretor Jean-Paul Salomé e a atriz Isabelle Huppert se reencontram no thriller A Sindicalista, que integrou a seleção oficial do Festival de Cannes em 2022. O saldo da segunda parceria do diretor com a atriz é dos melhores, resultando em um filme que sustenta muito bem uma atmosfera conspiratória no ambiente corporativo e político ao mesmo tempo que mergulha nos meandros psicológicos da sua protagonista, vítima de uma violência indefensável ao longo da trama.
A Sindicalista é baseado no livro de mesmo título escrito pela jornalista Caroline Michel-Aguirre e conta a história de Maureen Keaney, uma representante sindical que mediava os interesses dos trabalhadores de uma usina nuclear chamada Areva com os seus chefes. Após receber denúncias anônimas de que a nova diretoria da Areva pretendia estabelecer parceria com a China a fim de construir usinas de baixo custo, Maureen é perseguida e é encontrada em casa amordaçada após ser vítima de um estupro. Conforme a investigação do caso de Maureen tem andamento e algumas pistas soltas vêm à tona, a versão da protagonista é descredibilizada pela polícia e de vítima ela passa a ser suspeita e ter sua reputação manchada pela opinião pública.
A condução de Salomé para A Sindicalista é das melhores. O diretor se apropria muito bem do gênero, evitando chavões, mas também sabe construir todo o ambiente persecutório de perigo iminente que toma conta da vida da sua protagonista. Salomé tem um olhar muito objetivo para a história, captando todo o ambiente hostil e mesquinho dos gabinentes que Maureen transita, especialmente quando eles são tomados por homens extremamente misóginos. Ao mesmo tempo, em meio a essas tensões de gabinetes, o diretor não é necessariamente frio ou indiferente aos sentimentos, sobretudo da sua protagonista quando o longa retrata sua seara particular, suas relações familiares e afetivas e como ela lida com os traumas psicológicos da violência da qual é vítima.
Isabelle Huppert tem um ótimo desempenho nesse filme transitando com habilidade ímpar por todas as fases da sua personagem. Se no início somos apresentados a uma Maureen aguerrida, convicta e eficiente no cargo que ocupa, conforme a história vai ganhando peso e trazendo consequências pessoais para a personagem, Huppert consegue expor outras camadas dessa mulher, ganhando ainda mais humanidade na tela. Maureen atravessa todos os estágios pós-traumáticos do ato que sofreu - dúvida, culpa e, no fim, a força para se reerguer e lutar por uma sentença justa para seu caso - e Huppert consegue trazer isso em cena de maneira inteligente e sensível, sem afetações cênicas.
Em um filme como A Sindicalista, é revoltante constatar como o mundo corporativo parece blindado a qualquer tipo de confronto que seja capaz de desestabilizá-lo e como o elo fraco ainda é representado pelos indivíduos. Jean-Paul Salomé faz um filme extremamente comprometido em expor ranhuras sociais dos nossos tempos (corrupção, machismo etc.), dimensionando-as em um nível macro, social, e micro, os danos pessoais que o caso apresentado no longa trouxe para sua protagonista.
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