Meca hedonista
Com Babilônia, Damien Chazelle faz um filme de excessos que pode agradar e desagradar plateias com a mesma intensidade.
Da temporada de premiações de 2023, Babilônia é certamente um dos projetos mais divisivos. Orquestrado por um dos "queridinhos" da nova geração, o diretor e roteirista Damien Chazelle, de filmes cultuados e premiados como Whiplash e La La Land, Babilônia é um longa justificadamente marcado por excessos que começam na primeira sequência do filme. Uma rave em uma mansão hollywoodiana com direito a muito consumo de droga, sexo nas mais diversas modalidades e até à presença de um elefante dá o tom que acompanhará a história do diretor até o fim: um ritmo acelerado, que exige fôlego do espectador, e uma proposital dispersão do seu foco narrativo, que, por sua vez, demanda atenção do público.
Apesar de ter figuras importantes na trama, o foco de Babilônia é Hollywood e os bastidores da indústria, desmistificando algumas ideias acerca da meca do cinema mundial. A trama de Babilônia começa quando o destino de Manny Torres (Diego Calva), um jovem mexicano em Los Angeles, atravessa a trajetória de Nellie LaRoy (Margot Robbie), uma garota de origem pobre que sonha se tornar uma grande estrela de cinema. Os dois se conhecem na festa que dá início ao filme e ao longo dos anos o espectador verá a trajetória desses personagens se cruzarem enquanto algumas transformações ocorrem na indústria cinematográfica, a mais intensa delas é o advento da captação do som.
Outras obras já se interessaram pelo contexto de Babilônia - certamente o leitor se lembrará, por exemplo, de Cantando na Chuva ou O Artista -, mas o longa de Chazelle tem particularidades que cabem frisar e que o transformam em um exemplar bem interessante de filme que reverencia a própria história do cinema, mas não ameniza suas passagens mais sombrias. Chazelle imagina a era de ouro de Hollywood como um delírio vertiginoso, sedutor e, consequentemente, viciante (para os personagens, estar em Hollywood e participar da indústria proporciona um prazer que se equipara ao consumo de drogas). Esta representação da indústria repleta de excessos vão na contramão da idealização glamourosa e, por vezes, polida, asséptica, dos primeiros anos do cinema. O cineasta destaca como os filmes desse período eram realizados por outsiders e como gradualmente a arte foi apropriada por uma elite intelectual e financeira, marginalizando os profissionais de outrora.
Em cada um dos momentos retratados, Chazelle parece se ater por longos minutos a sequências específicas que dividem sua atenção em ações paralelas vividas por seus personagens: a rave do início do longa, a filmagem de um épico, o primeiro uso de técnicas e equipamentos de captação de som por uma equipe, uma festa para a elite com artistas da indústria e uma descida ao submundo de um financiador excêntrico interpretado por Tobey Maguire. Em cada um desses momentos, Chazelle imprime muita personalidade, energia e humor ao seu filme, mas também flerta com o tom mais melancólico que toma conta do desfecho dos personagens de Diego Calva, Brad Pitt e Margot Robbie, selando o agridoce representativo da sétima arte: uma história marcada por dissabores, como o caráter descartável das suas estrelas e do seu próprio passado diante do advento de novas tecnologias, mas também o fascínio com a imersão que a espectatorialidade do cinema traz, sua alardeada magia.
Ao longo de três horas - que podem parecer excessivas para muitos (particularmente, fluíram bastante e compõem uma obra completa e consistente) -, Chazelle faz um filme cheio de energia que sabe muito bem conviver com sensações opostas: a excitação, o frenesi, e a melancólica decadente. É um longa que reserva um olhar mais "sujo" para a indústria em seus primeiros anos, mas nem por isso deixa de lado a beleza, quase que divina daquilo que aquelas personagens estavam criando, o cinema.
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