Crítica: Adão Negro


Entretenimento vertiginoso

Adão Negro não é brilhante, mas oferece boas doses de diversão e introduz uma simpática equipe de super-heróis, a Sociedade da Justiça.



A ideia de "filme de vilão" se popularizou no blockbuster hollywoodiano, mas quase sempre o resultado tem uma qualidade questionável. Se pensarmos em longas como Malévola, Esquadrão SuicidaMorbius, Venom ou até Cruella e Coringa, que têm a sua parcela de fãs, mas estão longe de ser consenso, essa ideia do protagonismo do mal não tem um histórico muito favorável. O maior problema de alguns desses filmes é que, dramaticamente, a presença do vilão em uma história serve para oferecer um contraponto, então quando ele assume um protagonismo sua jornada perde um pouco do propósito. Invariavelmente, alguns desses títulos incorrem no erro de transformar um vilão em herói porque a única forma com que sabem lidar com um protagonista é quando ele, de alguma maneira, salva o dia, se redime, desfigurando por completo a essência desse tipo de personagem. 

Ainda que Adão Negro se venda em alguns momentos como filme de vilão, o personagem-título está mais para anti-herói do que para vilão e, talvez, por isso mesmo a proposta do seu protagonismo aqui funcione melhor do que outras empreitadas do gênero. É um personagem que tem um código de conduta particular que oras pode coincidir com os planos dos heróis, em alguns momentos ele se alia a eles, oras pode representar um empecilho. O longa de Jaume Collet-Serra trabalha muito bem com essa maleabilidade do personagem, trazendo isso como trunfo dramático de sua trama. Acerta sobretudo por trazer a simpática equipe de heróis Sociedade da Justiça como seu contraponto, fazendo com que a jornada do protagonista soe orgânica e desafiadora para ele mesmo.


Adão Negro explora a origem do personagem-título, um escravo que ganha poderes mágicos, e seu despertar tempos mais tarde. Diante da imprevisibilidade dos seus atos e da magnitude do seu poder,  um grupo de heróis responsável pelo equilíbrio internacional chamado Sociedade da Justiça é convocado para conter Adão Negro no seu retorno a Kahndaq, um país miserável controlado por militares. A população de Kahndaq clama desesperadamente por algum tipo força sobre-humana que possa tirá-la dessa situação insustentável. Herói ou vilão, Adão Negro passa a ocupar esse lugar no imaginário do povo.

No longa, instigado pelos questionamentos dos demais personagens, Adão Negro vive o tempo inteiro esse conflito de identidade sobre a natureza das suas ações.  Na interação dele com a população de Kahndaq também é interessante como o longa apresenta um outro ponto de vista (mais problematizador) sobre heroísmo e vilania, conceitos que parecem tão engessados por blockbusters que se passam na maior parte das vezes nos EUA. Em Adão Negro, não há respostas óbvias para o certo e o errado e diante disso a interação do anti-herói com os membros da Sociedade da Justiça é o grande achado do filme. 

Como Adão Negro, Dwayne 'The Rock' Johnson funciona parcialmente. Particularmente, as melhores lembranças de 'The Rock' nas telas são quando o astro injeta um certo humor na sua persona meio "brucutu", como faz na franquia Velozes e Furiosos ou em Jumanji. Aqui, 'The Rock' não pode fazer isso porque Adão Negro é um outro tipo de personagem, então, na maior parte do tempo, o ator está de cara fechada, sendo badass... Enfim, é um papel que exige um outro tipo de abordagem. Nesse sentido, Adão Negro é beneficiado pela presença eletrizante de Pierce Brosnan (impecável como Sr. Destino), Aldis Hodge (o Gavião Negro), Quintessa Swindell (Cyclone) e Noah Centineo (Esmaga-Átomo) como os diplomáticos integrantes da Sociedade da Justiça. Há um grande vilão na história, o Sabbag, que não diz muito a que veio e que é mais uma criatura genérica feita por um CGI ruim, mas que acaba sendo dramaticamente relevante para algumas questões que surgem entre o Adão Negro e a Sociedade da Justiça. 

Adão Negro tem uma ação desenfreada. Se por um lado, as vezes muitas coisas acontecem e não há tempo nem mesmo para os protagonistas assimilarem alguns eventos ou as resoluções soam apressadas, por outro, o longa evita perder tempo com redundâncias, vai direto ao ponto e foge do atalho óbvio da história de origem para introduzir um personagem baseado em HQs de super-heróis. A própria inserção da Sociedade da Justiça, apresentada ao público pela sua ação e não através de uma gênese, é indício de como os roteiristas foram perspicazes em algumas escolhas narrativas.

Adão Negro parece interessante sobretudo por mostrar uma DC disposta a recomeçar sua ideia de construir um universo compartilhado, algo que foi pelos ares em razão da desastrada proposta criativa de Zack Snyder. Por aqui, há diversas linhas a serem exploradas no futuro (claro que tudo depende da manutenção da integridade da Warner nessa gestão da Discovery). O longa não é algo "fora da curva" entre os filmes de super-heróis, mas um filme-pipoca bem amarrado, divertido, com bons personagens, um olhar maduro para eles sem peder de vista o entretenimento do público regular e dos fãs do gênero.

Obs.: Há uma cena pós-crédito bem importante. Portanto, não saia da sala antes da sua exibição. 

 

Avaliação



Título original: Black Adam
Ano: 2022
Duração: 124 minutos
Nos cinemas
Direção: Jaume Collet-Serra
Roteiro: Adam Sztykiel, Rory Haines e Sohrab Noshirvani
Elenco: Dwayne 'The Rock' Johnson, Pierce Brosnan, Aldis Hodge, Noah Centineo, Quintessa Swindell, Sarah Shahi, Marwan Kenzari, Mohammed Amer.

Assista ao trailer:

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Chovendo Sapos: Crítica: Adão Negro
Crítica: Adão Negro
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