Gigolô americano
Em Red Rocket, Sean Baker retorna para contar a história de um ex-ator pornô trambiqueiro que resiste em amadurecer.
Da safra atual de realizadores estadunidenses, sem dúvidas, Sean Baker é um dos mais interessantes expoentes. Com títulos como Tangerine e Projeto Flórida no currículo, o diretor tem um apreço especial por protagonistas que estão à margem da sociedade, afastando-se de cenários glamourizados dos EUA na medida em que privilegia classes mais baixas em suas histórias, apresentando suas realidades duras, mas também evitando qualquer estigmatização a partir de inserções pontuais de ludicidade em suas vidas. Red Rocket mantém a assinatura do diretor nesse sentido.
O longa apresentado no Festival de Cannes do ano passado traz como centro da sua narrativa o ex-ator pornô Mikey Saber, papel vivido por Simon Rex. Quando somos apresentados ao personagem em Red Rocket, ele "não tem onde cair morto" e vai parar na casa da ex-esposa e da sogra em sua antiga cidade natal no Texas. Sem experiência profissional no currículo além do conteúdo de entretenimento adulto, o personagem passa a se manter como traficante de drogas até que conhece a atendente de uma loja de donuts e vislumbra na moça um talento para atuar na indústria pornô. Agenciar a carreira dessa promissora estrela da indústria passa a ser a saída para Mikey sair do "fundo do poço".
Ao som de Bye Bye Bye do 'N Sync, hit dos anos 2000, período de glória do protagonista de Red Rocket, Baker conta a história de um homem próximo dos 40 anos que não amadureceu. O diretor lança uma crítica à própria indústria pornô ao abordar, no fim das contas, quem fatura de verdade com o negócio e quem é descartado. A Mikey Saber resta viver dos seus números no Pornhub, da quantidade de prêmios que levou no "Oscar do pornô", se alimentando de qualquer mísera atenção ou interesse que personagens como a garota do donuts ou seu vizinho mais jovem têm por sua biografia. Baker constrói uma jornada tragicômica para esse sujeito. Fruto de um sistema perverso, Mikey acabou ficando no meio do caminho na sua construção como sujeito.
Como estudo de personagem, Red Rocket confirma a vocação de Sean Baker para construir jornadas complexas e repletas de subtextos para os protagonistas das suas histórias. No comparativo com os filmes anteriores do realizador, infelizmente, Red Rocket sai na desvantagem, mais pelas características do seu protagonista e do tipo de relação que ele constrói com o público do que pela execução do cineasta, que, mais uma vez, parece bem acertada. Enquanto em Tangerine e Projeto Flórida, torcíamos pelas protagonistas e era comovente perceber as formas como elas conseguiam driblar a aspereza de suas vidas, em Red Rocket, a trajetória de Mikey Saber desperta outro tipo de relação com o espectador, talvez menos engajada do ponto de vista afetivo. Nesse sentido, ainda que bem interessante, o mais recente trabalho do cineasta tem uma certa desvantagem.
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