Em 2019, o cineasta argentino Mariano Cohn trouxe para as telas o thriller 4x4, filme que trazia a história de um rapaz que ficava preso no carro de um médico depois de uma tentava de furto do veículo. O longa ganha uma versão brasileira com A Jaula, produção dirigida por João Wainer (do documentário Junho: O Mês que Abalou o Brasil de 2014), trazendo Chay Suede, Alexandre Nero e uma participação de Mariana Lima no elenco, tudo sob a supervisão de Cohn, que assina o roteiro junto com Gastón Duprat, também de 4x4.
Não tendo visto o longa original (e acreditamos que isso não seja um empecilho para avaliarmos a versão brasileira), A Jaula nos lembra propostas como as de Enterrado Vivo, filme de 2010 que colocava o ator estadunidense Ryan Reynolds como um personagem que subitamente se via preso em um caixão e tentava a todo custo sair daquela situação. O filme de Rodrigo Cortés era um longa de tensão eficiente, construído com recursos mínimos: um protagonista e um cenário de proporções reduzidas.
No caso de A Jaula, o personagem de Chay Suede é o centro da ação de todo o drama que Wainer constrói, trata-se de um garoto da periferia que viola as travas do carro de um médico com a convicção de estar realizando um ato de extrema subversão (ele até urina no banco traseiro do veículo). Em dado momento, no entanto, ele se dá conta de que caiu na armadilha de um verdadeiro psicopata.
A Jaula tenta a todo custo contextualizar sua situação no estado de convulsão social que o Brasil se encontra (se é que ele algum dia saiu dessa configuração). Alexandre Nero vivendo um médico que dá indícios de apoiar ideias de extrema direita, a típica figura classista que vocifera preconceitos e percepções distorcidas da sociedade com muita convicção. Do outro lado, Chay Suede interpreta a ponta mais frágil desse sistema, um rapaz "mastigado" por nossa estrutura social que não tem muito rumo na vida.
A iniciativa de Wainer é louvável, mas, infelizmente, quando propõe uma crítica social, A Jaula acaba caindo em construções rasas e não esmiúça muito a luta de classes que sugere no conflito entre o personagem de Nero e o de Chay Suede. Em dados momentos até parece não querer assumir uma posição na situação. Há ainda instituições que atravessam essa realidade e que também são exploradas com superficialidade pelo drama, como a polícia e a mídia, uma representada pela policial de Mariana Lima e a outra uma apresentadora de programa sensacionalista vivida por Astrid Fontenelle.
Infelizmente, A Jaula acaba sendo uma perda por outras vias também. Assistindo ao longa pela ótica do entretenimento, ele oferece muito pouco para o espectador. Nero e Suede estão ótimos em seus respectivos papéis, o que era de se esperar. No entanto, Wainer não consegue construir uma atmosfera de tensão e instabilidade que garantam a fidelidade do espectador na poltrona, sobretudo nos momentos em que ele tem apenas a situação de Suede tentando sobreviver à situação de estar preso em um automóvel por tanto tempo.
Título original: A Jaula
Ano: 2022
Duração: 1h 41 min
Nos cinemas
Direção: João Wainder
Roteiro: João Candido, Mariano Cohn e Gastón Duprat
Elenco: Chay Suede, Alexandre Nero, Mariana Lima.
COMENTÁRIOS