Após uma indicação ao Oscar em 1985 na categoria melhor atriz coadjuvante pelo seu desempenho em Retratos de uma Realidade de Martin Ritt, Alfre Woodard teve o destino de muitas de suas colegas. Pontualmente surgiu em produções como as séries Star Trek e Desperate Housewives longas como 12 Anos de Escravidão e Annabelle, mas nada que repetisse o feito da sua estreia na temporada de prêmios.
O drama Clemency teve o potencial de trazer os holofotes de volta para Alfree Woodard, tendo sido elogiada em diversos festivais pelos quais o filme passou, mas infelizmente não conseguiu fazer frente à máquina publicitária que garantiu o êxito de suas concorrentes a uma indicação aos prêmios de melhor atriz. Apesar disso, Alfre Woodard não decepciona no drama, entregando uma atuação não menos que visceral que dá outro valor a Clemency, um filme que nem sempre compensa o público com uma história bem resolvida.
Woodard interpreta uma burocrata responsável pelo "corredor da morte" que começa a avaliar as consequências de sua função. Bernadine Williams, personagem da atriz, tenta manter o controle da situação, estabelecendo um certo distanciamento emocional das condenações a morte da maioria dos presos cujos casos acompanha, mas em certo momento fica inevitável para a protagonista avaliar sua função.
Bernadine lida diariamente com uma atividade que a coloca na delicada situação de acompanhar de perto o desespero dos condenados e seus familiares, que lhes suplicam por uma segunda chance, mas no fim das contas ela acaba podendo fazer muito pouco por todos. A sucessão de situações como esta no cotidiano da protagonista a levam a uma situação de completo desgaste mental em um terceiro ato catártico, responsável por um momento memorável de Woodard nas telas, que interpreta essa personagem com firmeza e controle e desconstrói toda essa casca para conseguir expressar enfim gradualmente sua empatia. É uma interpretação linda de se acompanhar na tela.
Quem também tem um ótimo desempenho no drama é Aldis Hodge, intérprete de um dos principais condenados a pena de morte na história. Há uma fúria manifesta pela injustiça e uma integridade que o ator consegue manter durante toda a sua aparição no filme. É uma pena que o roteiro de Chinonye Chukwu não consiga encontrar muito o timing da sua história, demorando excessivamente para expor conflitos e os temas centrais da sua obra. O longa conta com uma direção interessante e que intervém muito pouco, o que confere uma sobriedade bem-vinda ao trabalho, mas fica evidente como uma "enxugada" na trama faria bem para a trama.
Apesar de todos os defeitos e de, por vezes, a morosidade de Clemency fazer a experiência de acompanhar Clemency até o fim ser penosa, os momentos finais de Alfre Woodard no longa são magnéticos e demonstram todo o potencial da atriz, infelizmente desperdiçada na indústria dos anos de 1980 para cá. Alfree Woodard entrega densidade em sua interpretação e surpreende o espectador com sua performance extremamente técnica e comprometida com a composição traçada para a sua personagem desde o princípio. Resultados como esse deveriam abrir diversas "portas" para uma profissional do seu calibre, mas ao que tudo indica Clemency será um caso isolado em sua recente filmografia.
Clemency, 2019. Dir.: Chinonye Chukwu. Roteiro: Chinonye Chukwu. Elenco: Alfre Woodard. Aldis Hodge, Richard Schiff, Wendell Pierce, Danielle Brooks, Michael O'Neill, Richard Gunn, LaMonica Garrett, Vernee Watson. Disponível no Google Play e Looke, 112 min.
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