por Enoe Lopes Pontes
Entre os dias 20 a 30 de agosto aconteceu o 31º Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo – Curta Kinoforum. De maneira remota, foram exibidas 212 obras no total. Dentro da programação existiam sessões divididas por alguns grupos, colocando produções brasileiras, latino-americanas e mundiais em categorias por localidades ou por temática, como a Novas Áfricas ou a Terror na tela. Pensando na pluralidade do evento, esta publicação reúne os filmes que mais se destacaram dentro da quantidade de produções assistidas pela autora do texto durante os dez dias do festival.
A Morte Branca do Feiticeiro Negro (2020, SC)
Sons, ruídos, imagens de arquivo e capturas novas feitas pelo diretor do filme (Rodrigo Ribeiro), o curta-metragem é intenso em cada segundo de seus dez minutos de projeção. Assumindo aqui o meu lugar de mulher branca, posso afirmar que há uma angústia forte transmitida na tela, assim como avisa a sinopse. Este outrora, que não é tão distante e continua a funcionar de outra forma, sob outras medidas e certo disfarce, é visto através de um fluxo continuo de cenas de rostos e lugares.
Assim, A Morte Branca do Feiticeiro Negro fala sobre “memórias do passado escravista brasileiro” e se faz extremamente necessário. Dentro da lista de curtas assistidos no Kinoforum é, sem dúvidas, o mais relevante, impactante e consciente. Isto porque cada elemento que aparece na tela está ali para dizer algo e provocar sensações não tão palpáveis, porque penetram a mente do espectador. Mais do que um filme é uma experiência, porque a combinação de elementos técnicos com o que está sendo dito causa algo quase físico em quem assiste.
As fases e experiências como mulher são colocadas com um fio narrativo que funciona, pois trazem um ritmo e, apesar de toda sensibilidade e delicadeza, mesclam a suspensão e o relaxamento. O filme traz incômodos, descobertas e desejos singulares. A junção do imagético com o poder das histórias faz do curta não apenas importante, mas gostoso de assistir.
Inabitável (2020, PE)
Uma mãe que busca a sua filha. Esta é a premissa que parece morar neste curta-metragem, dirigido por Matheus Farias e Enock Carvalho. Ao passo que a narrativa avança é possível começar a vislumbrar a temática central e a metáfora utilizada para falar sobre a transfobia é o maior ganho aqui. Em um universo que mescla o realismo do cotidiano com pinceladas de ficção científica, a protagonista Marilene investiga o mistério presente na trama. O seu olhar é como o nosso que vai retirando a cortina da dúvida até chegar ao desfecho da projeção.
A combinação dos movimentos de câmera com a atuação de Luciana Souza cria empatia, principalmente pela proximidade que é estabelecida com os seus sentimentos. Mas, tudo isto não é feito de uma maneira expositiva, pelo contrário. Os gestos e a voz dela são sutis, mas o olhar dialoga com a câmera que faz emergir sensações semelhantes a de tantas mães que devem procurar por suas filhas e seus filhos e de todos os transgêneros que já sofreram ou sofrem violências por serem quem são e podem aproximar o espectador desta realidade.
COMENTÁRIOS