Depois de um filme de tamanho vigor como Infiltrado na Klan, seria difícil para qualquer diretor produzir impacto no público com o mesmo vigor e vibração. É uma tarefa ingrata mesmo que o realizador em questão seja Spike Lee e mesmo que estejamos vivendo em um momento social que por seu caráter crítico seja extremamente estimulante para um artista politizado como ele. Destacamento Blood é o longa que sucede Infiltrado na Klan na carreira do cineasta e, ainda que traga temas relevantes e os apresente de forma explosiva e inventiva como é de praxe na trajetória do diretor, não é um capítulo tão exemplar assim na sua trajetória.
Produzido pela Netflix, o longa é mais uma leitura de Lee sobre temas como o racismo, a desigualdade social e a natureza humana e tem como pano de fundo a guerra do Vietnã. Destacamento Blood concentra toda a sua ação em um grupo de ex-combatentes negros do exército americano que retornam ao Vietnã para procurar um tesouro. Ao longo da jornada, eles relembram os tempos da guerra e a relação que estabeleceram com o comandante Stormin Norman, um homem que acabou se tornando uma espécie de figura mítica referencial em suas vidas
Destacamento Blood tem a interessante habilidade de contar eventos do presente e do passado sem que a exibição deles na tela soe confusa para o espectador, sobretudo porque Lee toma decisões técnicas e estéticas bem evidentes, a maioria delas relacionadas com a direção de fotografia do longa, seja no que concerne à razão de aspecto seja na tonalidade de exibição das cores. Enquanto no passado as dimensões da tela são reduzidas e trazem a sensação de envelhecimento da imagem, no presente o diretor explora com amplitude as dimensões espaciais. E é um recurso que tem muito impacto mesmo assistindo ao filme em telas menores.
Lee também tem um inventivo domínio cênico, sobretudo no que diz respeito a maneira como conduz as diferentes ações dos seus atores, todos muito bem, em especial Delroy Lindo, que rouba a cena ao dar conta das diversas camadas do seu dúbio veterano de guerra. O maior problema do filme está mesmo na incapacidade que o realizador teve de perceber que sua história ganharia mais caso fosse um pouco mais enxuta e se dispersasse menos em subtramas que no final das contas pouco importam para a história nuclear.
Ainda que o discurso de Destacamento Blood seja reiterativo e nos leve a conclusões muito parecidas a respeito da maneira torpe como homens brancos no poder conduziram a sociedade à barbárie, as consequências dessa configuração sempre ficam mais elucidativas e ganham mais impacto nas telas quando mostradas para o público com a veemência que Spike Lee costuma trazer em suas histórias. O tom explosivo do discurso de Lee sobre essas questões sempre rende obras relevantes e Destacamento Blood não seria diferente. Destacamento Blood é muito pertinente como olhar sobre a sociedade em momentos isolados e é uma pena que o trabalho como um todo não se mostre tão conciso e fluido quanto o exemplar anterior da sua carreira (e a comparação e expectativa é inevitável, por mais que qualquer espectador, crítico ou não, negue).
Da 5 Bloods, 2020. Dir.: Spike Lee. Roteiro: Spike Lee, Danny Bilson, Paul De Meo e Kevin Willmott. Elenco: Delroy Lindo, Jonathan Majors, Clarke Peters, Chadwick Boseman, Jean Reno, Norm Lewis, Isiah Whitlock, Mélanie Thierry, Paul Walter Hauser, Johnny Nguyen, Sandy Huong Pham, Van Veronica Ngo. Disponível na Netflix, 154 min.
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