Por Klaus Hastenreiter
A subversão de um gênero pode ser uma
consequência natural de seu desgaste. A repetição de narrativas que se utilizam
de zumbis para criar horror passa por ciclos viciosos desde 1968, quando George
Romero trouxe seu clássico A Noite dos Mortos-Vivos para as telas. Zumbilândia chega em 2009, em um momento onde poucos filmes sobre o tema
ganhavam destaque nos cinemas, e que, assim como Todo Mundo Quase Morto (Edgar Wright) fizera apenas cinco anos antes, se utiliza da comédia para
contar a história de sobreviventes de uma infecção zumbi.
Contar a história de Zumbilândia em 2009,
período pré-Walking Dead (um dos grandes responsáveis pela saturação dos
mortos-vivos na cultura pop), é bastante diferente de contá-la em 2019, ao meio
de um turbilhão de séries, filmes, games e HQs que se repetem em um bombardeio
de apocalipses “Z” alternativos. Sendo assim, parece bastante acertado como os
roteiristas Rhett Reese e Paul Wernick (Deadpool) constroem uma sequência tão
consciente das necessidades narrativas e mercadológicas que precisam saciar.
Eles extrapolam a paródia simplória ao conceber uma mitologia coesa e ao
apresentar personagens interessantes, que por mais que não se distanciem muito
dos moldes de seus arquétipos, trazem carisma e graça ao roteiro.
E é muito bacana como a dupla consegue unir as
raízes da concepção social dos zumbis com a sátira política em voga na cultura
estadunidense. Em um momento de polarização excessiva e a radicalização do
debate em uma sociedade refém do seu próprio sistema econômico, Zumbilândia provoca risos com seu tom cotidiano em meio ao absurdo. Em determinada cena, a
dupla Columbus e Talahasse, o tímido e neurótico protagonista e seu reacionário
fiel companheiro, andam de patinete motorizado no meio de um shopping em
ruínas, travando um diálogo absolutamente banal. O contraste entre o contexto e
o assunto dá margem para analises muito atuais, sobre uma sociedade à beira do
colapso que não consegue se desprender de seu universo individualista e de
consumo exacerbado.
O filme expressa uma preocupação de achar o
limite entre o retorno ao estilo que consagrou seu antecessor e o medo de soar
repetitivo, falhando em ambos os termos em escorregadas ocasionais. Se o longa
de 2009 exibia uma objetividade em seus 87 minutos, a longa duração é notada em
sua sequência, onde situações e piadas extremamente divertidas perdem força
pela redundância. De um lado, momentos inéditos e bastante espirituosos como a
classificação dos novos zumbis e a morada na Casa Branca pós-apocalíptica se
destacam, enquanto a repetição cansativa das regras de sobrevivência e a
desinteressante fuga da garota Little Rock conferem um peso extra e
desnecessário para o longa.
Zumbilândia: Atire duas vezes, assim como seu
antecessor, é sobre achar seu lugar no mundo. Sobre construir uma família no
meio de um turbilhão de loucuras que o mundo contemporâneo tem para oferecer,
se esquivando da zumbificação contínua que os discursos e as correntes de massa
provocam nas pessoas. Um parque de diversões assumidamente imaturo e
despretensioso, que consegue ir além ao tirar sarro da própria sociedade que
paga ingresso pra assisti-lo.
PS: A cena pós-créditos é um dos momentos mais
divertidos do cinema em 2019.
Zombieland: Double Tap, 2019. Dir.: Ruben Fleischer. Roteiro: Dave Callaham, Rhett Reese e Paul Wernick. Elenco: Woody Harrelson, Jesse Eisenberg, Emma Stone, Abigail Breslin, Rosario Dawson, Zoey Deutch, Avan Jogia, Luke Wilson, Thomas Middleditch, Victoria Hall, Victor Rivera. Sony, 99 min.
Assista ao trailer:
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