Alicerçado na ótima interpretação de Marco Nanini, Greta é um drama do cearense Armando Praça que narra a história de Pedro, um enfermeiro do sistema público de saúde cuja amiga passa por um grave problema, mas não quer ser tratada. O caso passa a ser um start para o longa olhar para esse personagem e sua reflexão para a forma como até então sua vida caminhava. O personagem de Nanini está em um estágio da vida em que passa a refletir sobre a solidão e a passagem do tempo, aspectos que tenta resolver com relacionamentos casuais mantidos a partir de troca de favores e chantagens com pacientes internados no hospital.
O longa de Praça é centrado em personagens marginalizados por suas condições sociais, ou seja, figuras que estão longe de serem contempladas pelas esferas privilegiadas da sociedade brasileira. O diretor e roteirista faz o retrato melancólico de um estrato da comunidade LGBTQI+, uma geração que colhe os frutos de tempos ainda mais difíceis e preconceituosos que os atuais. Tanto o protagonista interpretado por Nanini como a transexual vivida pela esplêndida Denise Weinberg, são figuras que deixaram parte do viço pela vida para trás na busca - olha que ironia - pela garantia da sua própria existência. Essas personagens trazem em suas respectivas jornadas ecos de dificuldade de (auto)aceitação, exclusão social, abusos afetivos e abandonos. Esse tipo de histórico deixa marcas severas em suas personalidades, seja a aspereza da personagem de Weinberg, seja o recolhimento ou dificuldade de socialização do protagonista de Nanini.
Praça não pincela a jornada dos seus personagens com cores suaves em Greta, tornando o filme um estudo preciso na exploração de sentimentos que flertam com a tristeza, como a constante sensação de deslocamento e de deriva sentida pelo seu protagonista. Ao longo da história, na medida em que se depara com a possibilidade concreta da morte de sua melhor amiga e com uma paixão arrebatadora por um fugitivo da polícia que a qualquer momento pode escapar do seu controle, o Pedro de Nanini sente medo e ansiedade.
O protagonista de Greta se depara com a dissolução das suas seguranças e, conforme esse estudo psicológico avança no filme, realidade e projeção fantasiosa, tecida a partir do fascínio do protagonista pela atriz Greta Garbo no clássico hollywoodiano Grande Hotel, tensionam esse personagem, permitindo Marco Nanini entregar uma interpretação grandiosa como só ele sabe executar quando lhe é dada uma oportunidade como esta. Compondo as nuances de um personagem cheio de desejos e gradualmente tomado por inseguranças afetivas que julgava não ter, Nanini eleva Greta como obra oferecendo a esse protagonista nuances insuspeitas ao próprio roteiro de Praça. É o tipo de filme guiado pela maestria de um gênio sensível da interpretação.
Greta, 2019. Dir.: Armando Praça. Roteiro: Armando Praça. Elenco: Marco Nanini, Denise Weinberg, Démick Lopes, Gretta Sttar. Pandora Filmes, 97 min.
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