Em 2016, o cineasta iraniano Babak Anvari conquistou a atenção internacional com o longa de terror Sob a Sombra, que explorava alguns elementos da história do país pós-revolução para conduzir um conto sobre o sobrenatural. O sucesso desse filme de Anvari permitiu que ele tivesse uma trajetória semelhante a de tantos outros realizadores fora do circuito de língua inglesa, ou seja, ser cooptado pelos produtores desses principais centros de realização cinematográfica. Contato Visceral é o primeiro longa de Anvari nessa empreitada e ele conseguiu um relativo controle criativo no projeto, dirigindo um roteiro de sua própria autoria baseado em um romance de Nathan Ballingrud.
O filme acompanha a vida de um barman logo depois que um dos seus clientes passa a ser vítima de estranhos eventos. Logo, a vida do protagonista fica "de cabeça para baixo" afetando seu rendimento no trabalho e suas relações, sobretudo com sua namorada, uma jovem que está desenvolvendo uma tese.
Em Contato Visceral, Anvari é bem menos "legível" do que ele é em Sob a Sombra. Ainda que não seja tão fã do longa anterior como a maior parte de cinefilia atual, reconheço os méritos daquela produção em construir uma alegoria tão eficiente sobre a situação social do Irã. No caso de Contato Visceral, Anvari parece fazer o extremo oposto, apresentando uma história que parece ter o prazer de se apresentar indecifrável ao espectador. A gente consegue entender em alguns momentos que o longa aborda o uso de aparelhos digitais e, sobretudo, as redes sociais intermediadas por eles como aspecto nevrálgico da crítica, mas não é uma associação tão bem construída assim.
O protagonista interpretado por Armie Hammer é acometido por uma espécie de ira que gradualmente transforma a sua personalidade. Situações bizarras que envolvem chagas que aparecem no corpo do personagem, o ambiente doentio da sociabilidade digital e insistentes baratas que se proliferam na casa e no ambiente de trabalho do protagonista tomam conta da narrativa sugerindo alguma concatenação semiótica que nunca é muito precisa. Não que o longa precisasse ser didático em suas simbologias, mas se está apresentando essa proposta ao espectador que, ao menos, o faça de maneira que dê alguma oportunidade a ele de estabelecer links lógicos entre os signos.
Com uma estrutura narrativa que não captura em momento algum a atenção do espectador, Contato Visceral parece um amontoado de impressões vagas sobre eventos que envolvem personagens que sequer são apresentados com alguma consistência na tela. Adotando no automático a chave da apresentação de "bizarrices" visuais por segundo, o filme exibe um certo pedantismo de um cineasta a quem talvez tenha sido dado crédito cedo demais em sua carreira.
Wounds, 2019. Direção: Babak Anvari. Roteiro: Babak Anvari. Elenco: Armie Hammer, Dakota Johnson, Zazie Beetz, Karl Glusman, Christin Rankins, Brad William Henke, Ben Sanders, Alexander Biglane, Luke Hawx. Disponível na Netflix, 95 min.
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