Com um pouco mais de três horas de duração, o drama Nunca deixe de lembrar tem o mérito de conseguir levar para a tela toda a jornada de assimilação dos efeitos do nazismo na arte e na sociedade alemã. Dirigido por Florian Henckel von Donnersmarck após o vexame hollywoodiano que foi O Turista com Angelina Jolie e Johnny Depp, o mais recente projeto do diretor alemão justifica a sua duração por suas tomadas grandiosas e fotografia esmerada (indicada ao Oscar, inclusive) narrando de maneira épica episódios que ocorrem durante e depois da Segunda Guerra Mundial como um filme ambicioso sobre a sombra do nazismo na história alemã, Nunca deixe de lembrar consegue ser eficiente como drama histórico e como um olhar intimista para a psicologia de seus personagens, contemplando as dimensões macro e micro do processo.
O longa inicia sua narrativa nos mostrando uma jovem mandada ao campo de concentração por um médico nazista que autoriza a sua condenação à morte alegando que ela sofre com problemas mentais. Anos mais tarde, acompanhamos a trajetória do seu sobrinho, um aspirante à artista que se apaixona por uma estudante de moda no pós-guerra e que, posteriormente, se depara com os efeitos dessa infância durante um momento complicado da vida política alemã na sua própria vida e na sua produção artística, servindo-lhe de inspiração, mas também de fonte de tormento.
Donnersmarck não tem pressa de contar a sua história e isso traz benefícios a Nunca deixe de lembrar, que não perde o seu fôlego narrativo em função da sua duração. O realizador consegue se dividir entre os diversos enfoques e perspectivas da sua trama, tecendo profundas e sutis considerações sobre as marcas do governo de Hitler e como elas se estenderam no tempo como uma cicatriz latente da nação.
Ao mesmo tempo, Nunca deixe de lembrar se mostra como um filme que revela o poder da arte e porque ela acaba sendo o primeiro ponto de ataque desse tipo de projeto de estado, ao mesmo tempo em que o horror que ele causa também proporciona muita inspiração para sua produção artística. Nesse sentido é um longa sensível e que constrói um arco de superação de traumas familiares a partir da jornada do protagonista Kurt Barnert e como ele reescreve a própria trajetória interrompida da tia Elisabeth May.
Há ótimos desempenhos, como o do seu protagonista Tom Schilling, mas um dos destaques da obra é Sebastian Koch, que interpreta o médico nazista representante dos temores de Kurt. É um longa que explora ao máximo o potencial cinematográfico das suas imagens e, apesar de por vezes cair na reiteração dos dramas de guerra convencionais, encontra formas muito curiosas de desenvolver na sua trama o lugar de dores não processadas e que são difíceis de verbalizar, mas que se confundem com a própria jornada dos seus personagens, que têm que lidar com o ressentimento do autoritarismo dos seus governantes como um eco em sua memória.
Werk Ohne Autor, 2018. Dir.: Florian Henckel von Donnersmarck. Roteiro: Florian Henckel von Donnersmarck. Elenco: Tom Schilling, Sebastian Koch, Paula Beer, Saskia Rosendahl, Oliver Masucci, Hanno Koffler, Cai Cohrs. Disponível no Net Now, 189 min.
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