Tyler Perry faz de 'Acrimônia' o seu 'Atração Fatal' com comicidade involuntária


Mais recente longa de Tyler Perry, diretor, roteirista e produtor americano conhecido por obras com proposições inclusivas na escalação do seu elenco, contemplando prioritariamente atores negros, Acrimônia é um verdadeiro show de humor involuntário. O filme tem a pretensão de ser um Atração Fatal para a atriz indicada ao Oscar e vencedora do Emmy Taraji P. Henson (do filme O Curioso Caso de Benjamin Button e da série Empire), mas acaba tendo as intenções do seu realizador frustradas pelo número sem fim de escolhas constrangedoramente primárias da sua história, mas sobretudo por não conseguir dosar o tom do seu drama. 

Narrado propositalmente como um daqueles romances baratos de banca de revista cuja capa é invariavelmente é ilustrada por um descamisado sarado, Acrimônia nos conta a história de Melinda, uma mulher cuja vida praticamente gira em torno do seu casamento com Robert. Ela começa a ter sérias desconfianças sobre a fidelidade do marido, um profissional inicialmente frustrado cuja carreira foi viabilizada pela ajuda financeira dela. Quando eles se separam, a ira de Melinda cresce, sobretudo porque ela fica sabendo que o ex ficou rico e está exibindo sua felicidade publicamente com a nova esposa nas redes sociais. 


A trama de Acrimônia leva uma hora e meia para engatar. Até lá, o público é confundido pelo ar conceitual que Perry tenta imprimir à história, intercalando sua trama com verbetes de dicionário que supostamente têm relação com os estágios emocionais da sua protagonista. Perry constrói a jornada desse relacionamento com total apatia. No terceiro ato do filme (os seus trinta minutos finais), a história assume um tom exagerado e trash que deveria ter sido o caminho escolhido pelo diretor ao longo de toda a sua dramatização, afinal é aqui que acaba residindo a mínima dose de entretenimento que esse longa é capaz de proporcionar. 

É no terceiro ato que a interpretação de Taraji P. Henson como a sociopata Melinda sobe no tom e a atriz protagoniza momentos singulares na sua carreira. Do barraco familiar na casa dos irmãos digno de um episódio do célebre programa brasileiro Casos de Família, passando para as cenas de tribunal nas quais a personagem lança olhares fulminantes para todos até a stalkeada que dá nas redes sociais do ex, tudo é de um exagero absurdo, destoando por completo da apática trajetória inicial do longa. O filme ainda encerra com uma tensão em alto mar repleta de momentos non sense que dão provas de que, ao final, Perry realmente não sabia mais o que fazer com sua história e apelou para soluções descabidas, entre elas o fim da sua protagonista, que envolve um machado e a âncora de um barco. Toda a sequência do barco aliás é digna da dramaturgia de Tommy Wiseau, cineasta que ficou célebre por ser responsável por um dos piores filmes já feitos na história do cinema, The Room. Nela, os personagens tomam decisões estapafúrdias, dizem e fazem coisas que não têm o menor sentido e estão fora de qualquer razoabilidade humana. 

Estranhamente sóbrio na maior parte da sua projeção, tendendo para a apatia por uma hora e meia de duração, e no fim descobrindo a chave de comunicação com o público do "novelão mexicano", algo que, por sinal, poderia ao menos um entretenimento minimamente interessante, Acrimônia ilustra apenas um diretor que quis aparentar ser algo quando deveria ter dado vazão a todo teor "cafajeste" da sua própria história. Tivesse abraçado as cores fortes, o melodrama estapafúrdio, ou seja, a própria canastrice da sua trama de vingança e traição, Acrimônia ao menos se enquadraria como um filme tão ruim que se torna prazeroso de assistir, mas ele não é bem isso, pelo menos em boa parte do seu tempo. Do jeito que ficou, soa mais como um mashup mal ajambrado de Maria do Bairro e The Room, do Tommy Wiseau. 


Acrimony, 2018. Dir.: Tyler Perry. Roteiro: Tyler Perry. Elenco: Taraji P. Henson, Lyriq Bent, Crystle Stewart, Jazmyn Simon, Ptosha Storey, Danielle Nicolet, Nelson Estevez, Kendrick Cross, Jay Hunter, Aijona Alexus. Paris Filmes, 120 min. 

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Chovendo Sapos: Tyler Perry faz de 'Acrimônia' o seu 'Atração Fatal' com comicidade involuntária
Tyler Perry faz de 'Acrimônia' o seu 'Atração Fatal' com comicidade involuntária
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