Paris 8 é um filme que questiona a sustentação das paixões da juventude na maturidade. O cineasta Jean-Paul Civeyrac faz uma narrativa sobre um jovem do interior da França que vai para Paris estudar cinema na Sorbonne e empreende uma jornada de amadurecimento pessoal no ambiente acadêmico através das relações estabelece ao longo de sua trajetória. Do próprio meio universitário, já que fora diretor da La Fémis e atualmente ensina na Universidade Paris 8, Civeyrac utiliza sua experiência desde a época de estudante de cinema para narrar esse enfrentamento da vida e o lugar do romantismo pela profissão nesse cenário, atraindo uma inevitável empatia especialmente por espectadores que tenham passado por jornada semelhante.
Como forma, Civeyrac traz para Paris 8 uma atmosfera típica do cinema francês da metade do século passado, emulando o preto e branco na paleta de cores da sua fotografia, o ritmo lento no desenrolar da sua história e na maneira como seus personagens estabelecem suas dinâmicas de relacionamento e transitam na tela, assim como as inúmeras divagações filosóficas espalhadas pelo roteiro. Esse esforço de contrapor sua forma com o discurso do filme traz uma promessa para Paris 8: utilizar estratégias cinematográficas de uma escola do cinema marcada pelo romantismo, arrojo artístico e engajamento político num contexto contemporâneo, dotado inescapavelmente de uma crise de identidade do próprio cinema. Os jovens estudantes de Paris 8 carregam um romantismo pelo seu objeto de estudo, mantendo a crença de que o cinema de fato pode empreender transformações, mas também oscilam com a apatia de um contexto social que os leva a não ter muita segurança dessa percepção.
O diálogo que Paris 8 procura empreender entre discurso e forma, uma espécie de crítica a suas referências no mundo real acaba não sendo muito efetivo da parte do seu realizador, transformando o longa numa jornada psicológica que poderia ser facilmente encurtada, afinal ostenta quase duas horas e meia de duração. O espectador fica um pouco incerto do que Civeyrac quer efetivamente dizer com tal junção, afinal não há nem vestígio da ironia que poderia transformar Paris 8 num pertinente e poderoso metadiscurso. Dos males, o menor, ao menos nessa conjuntura desarmonica o filme demonstra sinais de conseguir fazer com que sua narrativa se sustente sem estar completamente ensimesmado na metalinguagem.
O elenco de jovens e inexperientes atores é um ganho para o longa já que todos trazem um certo frescor e ingenuidade para seus personagens, pontos extremamente necessários para a experiência do espectador com a narrativa. A performance do jovem Adranic Manet é um ponto especialmente forte de Paris 8. O ator consegue dimensionar todo o amadurecimento do protagonista ao longo da história, fazendo com que seja possível que o jovem Etienne que conhecemos acanhado e encantado com os primeiros contatos no ambiente universitário se transforme ao final do filme num homem mais pragmático, até mesmo nos seus relacionamentos amorosos.
No final das contas, Paris 8 acaba sendo eficiente naquilo que tem a dizer sobre o lugar do cinema e a sua percepção romântica de transformação do mundo pela arte num cenário apático, utilitário e de fervor político frágil que vivemos. O filme finaliza com questionamentos sem respostas que parecem atormentar o seu protagonista e que, possivelmente, encontrará eco no público: Qual o lugar do cinema como prática intelectual, política e expressiva no contexto atual? A sensação de uma geração anacrônica, presa no presente a um passado que não vivenciou e sem compreender que, como qualquer outra prática, há a urgência de fazer com que ela se desagarre da sua própria história, se adapte e abrace o agora fica como um gosto amargo dentro e fora da tela.
Mes provinciales, 2018. Dir.: Jean-Paul Civeyrac. Roteiro: Jean-Paul Civeyrac. Elenco: Andranic Manet, Corentin Fila, Diane Rouxel, Jenna Thiam, Gonzague Van Bervesseles, Nicolas Bouchaud, Valentine Catzéflis, Charlotte Van Bervesseles, Sophie Verbeeck. Cineart, 137 min.
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