Entre os candidatos ao Oscar 2018, Trama Fantasma é, sem sombra de dúvidas, o mais desafiador e comprometido com a linguagem cinematográfica. As escolhas do diretor e roteirista Paul Thomas Anderson em seu mais recente filme exibe aquilo que os mais ardorosos fãs de títulos como Magnólia ou Sangue Negro, só para citar alguns da sua filmografia, jamais duvidaram: o cineasta é um mestre que utiliza com destreza, inteligência e sensibilidade todos os recursos de uma gramática cinematográfica à sua disposição. Todos os filmes de Anderson evidenciam um diretor que conhece e é apaixonado como poucos pelo seu próprio ofício, exibindo repertório e consciência sobre cada caminho trilhado por sua história. Nesse sentido, Trama Fantasma é um dos pontos mais altos da sua carreira.
Contando um romance nos seus próprios termos, Paul Thomas Anderson nos apresenta Reynolds Woodcock em Trama Fantasma, um renomado e metódico estilista inglês que faz roupas para as mulheres mais importantes da sociedade na década de 1950. Durante uma viagem, Reynolds conhece uma simples garçonete chamada Alma por quem fica encantado, sobretudo pelas medidas do seu corpo, perfeitas para conceber alguns dos mais belos figurinos. Conforme a relação dos dois vai ficando mais séria, alguns desajustes e conflitos de interesse se tornam latentes e ambos terão que decidir se prosseguem na relação ou seguem suas próprias vidas.
Trama Fantasma é o primeiro romance da carreira de Paul Thomas Anderson desde Embriagado de Amor, mas é uma história de amor sombria. Durante boa parte da projeção, a principal obsessão do cineasta com seus protagonistas Reynolds e Alma é o descompasso de suas aspirações amorosas ainda que gradualmente fique claro para o espectador que ambos nutrem um sentimento muito forte pelo parceiro, mas não conseguem harmonizá-lo com suas ambições pessoais. Alma constrói um ideal romântico em torno de Reynolds, sempre esperando dele atos governados por demonstrações explícitas de carinho. Já Reynolds é levado pela sua incapacidade de ceder aspectos da sua meticulosa rotina adaptando-a a uma vida compartilhada, não conseguindo ainda demonstrar carinho pela jovem esposa.
A dificuldade de comunicação entre o casal (ela esperando um amor romântico, ele uma relação "utilitária") faz com que Paul Thomas Anderson de maneira brilhante preencha o seu filme de tensões e transferências nos papeis de dominação do relacionamento. Se por um lado, numa determinada cena, a fotografia e a interpretação de Daniel Day-Lewis (impecável como sempre) convoque um ar mais soturno e de perigo iminente para a Alma da talentosa revelação Vicky Krieps, no mesmo instante a sequência é tomada por uma trilha sonora de acordes passionais de Jonny Greenwood. É como se Trama Fantasma vivesse constantemente numa "queda de braço" entre os dois personagens, oscilando entre duas percepções completamente opostas sobre uma relação amorosa.
A solução encontrada por Reynolds e Alma para a harmonia do matrimônio é sombria e, de maneira doentia, acaba atendendo às expectativas de ambos. Assim, com Trama Fantasma, Paul Thomas Anderson constrói uma história de amor contrariando qualquer protocolo ou expectativa que se tenha sobre o gênero, mas, ao mesmo tempo, oferecendo um enlace esperado para o mesmo. A diferença - e o diferencial da obra - é o caminho que o cineasta encontra para tanto, mostrando que, na maioria das vezes, o happy end não vem de maneira ortodoxa.
Phantom Thread, 2017. Dir.: Paul Thomas Anderson. Roteiro: Paul Thomas Anderson. Elenco: Daniel Day-Lewis, Vicky Krieps, Lesley Manville, Sue Clark, Camilla Rutherford, Joan Brown, Harriet Leitch, Dinah Nicholson, Julie Duck, Maryanne Frost, Elli Banks. Universal, 130 min.
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