Diretor de filmes difíceis de se digerir pelo público no circuito comercial, mas também abraçados pela crítica em festivais, como Mais Forte que Bombas e Oslo, 31 de Agosto, o dinamarquês Joachim Trier retorna aos cinemas com um projeto ainda mais audacioso que seus antecessores. Trata-se de um filme que flerta abertamente com o cinema de terror, o enigmático Thelma. Trazendo para o público uma protagonista capaz de produzir poderosas e perigosas manifestações sobrenaturais, o mais recente trabalho de Trier é um filme que demanda do público um intenso exercício de atenção às suas pistas simbólicas. É verdade que muitas vezes o longa soa redundante nas suas eventuais interpretações e na cartela de elementos que as mobiliza, no entanto, Thelma apresenta pontuais recompensas como experiência cinematográfica.
No longa acompanhamos a trajetória da personagem que dá título à história, uma jovem que está há algum tempo afastada da sua família e mora sozinha na cidade da Universidade onde começou a estudar. Thelma conhece Anja, uma colega por quem se apaixona, e começa a sentir culpa por nutrir tal sentimento e desejos pela moça. No decorrer da sua história amorosa com Anja, algumas convulsões que eram recorrentes na biografia de Thelma começam a se manifestar de maneira mais intensa e, na proporção que a jovem passa por alguns médicos, os segredos que a protagonista guardava com sua família vêm à público.
Durante todo o filme, Trier oscila suas atenções entre as convulsões de Thelma, seus efeitos em terceiros e como os mesmos são potencializados por um único fator, a culpa. Ao se culpar por sentir inveja do seu irmão mais novo, Thelma acaba, acidentalmente, punindo a criança e toda sua família. Por esse mesmo sentimento, a protagonista não consegue fortalecer os laços de afeto que constrói com Anja, evitando que a relação siga adiante. Em dados momentos da história, Trier insere fatores que potencializam os efeitos da culpa da personagem e contextualiza o espectador a respeito das grandes fontes de castração dos seus sentimentos e desejos: de um lado a religião, do outro a autoridade paterna e ainda a própria Thelma, maior algoz de si mesma.
O filme é calibrado por uma direção que não tem pressa para desamarrar os nós da sua história. Há ainda ótimos desempenhos, a começar pela sua protagonista, vivida pela atriz Eili Harboe, e por Henrik Rafaelsen, que dá vida ao pai de Thelma. No entanto, não espere uma fita de terror das mais expositivas. Thelma é temperado pela frieza dos países nórdicos, mas se beneficia da riqueza de significados que muitas vezes suas imagens bucólicas trazem para o espectador que procura decifrá-las ou simplesmente se entrega aos seus enigmas. Talvez em alguns momentos isso não seja o suficiente para o espectador comprar o próprio filme, mas Trier consegue compor uma atmosfera interessante e apresentar alguns insights interessantes.
Thelma, 2017. Dir.: Joachim Trier. Roteiro: Joachim Trier e Eskil Vogt. Elenco: Eili Harboe, Kaya Wilkins, Henrik Rafaelsen, Ellen Dorrit Petersen, Grethe Eltervåg, Marte Magnusdotter Solem, Anders Mossling, Vanessa Borgli, Steinar Klouman Hallert. Mares Filmes, 116 min.
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