Desde que finalizou seu compromisso com a franquia adolescente Crepúsculo, Robert Pattinson (e também a sua colega de elenco Kristen Stewart) vem movendo esforços consideráveis na construção de uma carreira artisticamente sólida. Jovem, bonito e com uma fanbase adolescente já estabelecida, Pattinson poderia seguir protagonizando grandes franquias, acumulando fortunas em Hollywood junto com tudo aquilo que conquistou nos tempos do vampiro Edward. No lugar disso, o ator inglês correu o risco de contrariar as expectativas do seu público cativo (o que inevitavelmente aconteceu, reconfigurando sua fanbase) e optou por se mudar em definitivo para o circuito europeu, conquistando a simpatia de um seleto grupo de autores cinematográficos, testando e se esforçando para corresponder às demandas dos papeis que lhe caiam no colo.
Pattinson estabeleceu parcerias com gente graúda como David Cronenberg, Werner Herzog e James Gray, fazendo uma transição que poucos conseguem: deixou de ser um ator cujas interpretações eram motivo de chacota entre críticos para se tornar um dos nomes mais celebrados da sua geração no circuito de festivais europeus. E isso não é uma "modinha" da crítica ou da cinefilia, seria injustiça ou, no mínimo, birra adolescente torcer o nariz para o amadurecimento do ator. Em filmes e papéis tão diversos como Cosmópolis, Mapas para as Estrelas, Life e The Rover, o ponto alto da sua carreira até então, Pattinson vem demonstrando amadurecimento artístico a passos largos. Bom Comportamento é o mais recente trabalho do ator e exibe fôlego nesse interessante projeto de carreira de Pattinson.
No filme, o ator interpreta Connie, um rapaz sem eira nem beira que assalta um banco junto com seu irmão mais novo Nick. Na empreitada, os dois acabam se dando mal e o segundo, que sofre de uma doença mental, é pego pela polícia. A fim de livrar o irmão da situação, o personagem de Pattinson empreende uma jornada para conseguir uma quantia em dinheiro a ser entregue a criminosos que consigam burlar o sistema e liberar Nick.
Frenético como a própria vida dos protagonistas, Bom Comportamento é um longa que pode passar a impressão de dispersão com sua câmera na mão, personagens indo de um lugar para outro, planos e ambientes nada assépticos, trilha enervante (um eletrônico com batidas oitentistas), cortes rápidos e a preferência por planos fechados, privilegiando relances nos rostos dos atores, jamais se fixando por muito tempo em nenhum deles. O filme dos irmãos Benny e Joshua Safdie, que se envolvem em departamentos diversos (direção, roteiro, montagem e até atuação, já que Benny interpreta o irmão de Pattinson), dá sinais de que é um trabalho extremamente calculado e cheio de energia. Sem uma grande temática que o norteie ou mesmo um frescor nas questões que o perseguem (o submundo do crime em Nova York e os laços de afeto que surgem e que acabam levando sujeitos a tal descaminho), o longa acaba deixando interrogações no espectador sobre a própria experiência de vivenciar a trajetória tortuosa dos seus personagens. Enfim, para onde tudo isso quer nos levar?
Sem dúvida, o grande atrativo é a interpretação de Robert Pattinson que, assim como Mapas para as Estrelas, Life ou The Rover, consegue ter nas mãos e dar conta de um tipo de personagem que vai na contramão daquilo que se espera do próprio ator, ao menos nos seus primeiros anos quando deu vida ao monocórdico Edward em Crepúsculo ou teve sua fama de sujeito apático explorada de maneira funcional por Cronenberg em Cosmópolis. Em Bom Comportamento, Pattinson interpreta Connie, um sobrevivente das ruas que possui um elo afetivo muito forte com seu irmão mais novo, sendo capaz de descer ao inferno para tê-lo de volta ao seu lado. Nesse sentido, Pattinson é responsável por dimensionar a força do afeto nutrido pelo seu personagem e conferir credibilidade aos caminhos que essa potência de sentimentos pode levá-lo.
Calibrado pelo seu protagonista, suas motivações e pelo contexto que o envolve, o compulsivo e entorpecente mundo do crime, Bom Comportamento é um filme sobre vidas que se transformam irreversivelmente. Bastou Connie, por medida de urgência, mirar caminhos nada virtuosos para ser tragado compulsivamente por uma cadeia de atos que o levam inevitavelmente a ruína. Quando Connie se dá conta do trajeto sem volta que percorreu e do destino de outros tantos que, assim como ele, acabaram em situações irreversíveis, já é tarde demais. O espectador se depara, em oposição, com Nick e o filme tem um respiro e dá espaço, após uma jornada sem tréguas, para personagens e público assimilarem tudo aquilo que fora vivido. O resultado dessa introspecção amarra e justifica a obra, não sei se com originalidade ou ineditismo, mas pelo menos com coerência e dosado pelos esforços de um ator que testemunhamos florescer a cada novo desempenho.
Good Time, 2017. Dir.: Benny e Joshua Safdie. Roteiro: Josh Safdie e Ronald Bronstein. Elenco: Robert Pattinson, Benny Safdie, Jennifer Jason Leigh, Barkhad Abdi, Taliah Webster, Necro, Peter Verby, Saida Mansoor, Gladys Mathon, Rose Gregorio. Paris Filmes, 101 min.
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