Por um momento, a ideia de unir Batman e Arlequina numa mesma história, utilizando a personagem criada por Paul Dini e Bruce Timm em Batman: The Animated Series como uma parceira de ação do detetive de Gotham me pareceu equivocada, mas Batman e Arlequina se revela o completo oposto desse prognóstico. O longa de animação com roteiro assinado pelo próprio Bruce Timm traz uma combinação interessante entre o humor da aqui ex-capanga do Coringa com a verve detetivesca das histórias do Batman, combinando elementos da série animada dos anos 90 - incluindo os traços da animação, muitas vezes deixada de lado nesses longas da Warner/DC - com a abordagem leve e cômica do seriado protagonizado por Adam West, explorando situações de humor com o herói em situações cotidianas, com direito até às clássicas onomatopeias em hiper destaque na tela na hora da ação.
Em Batman e Arlequina, Hera Venenosa se une ao Homem Florônico a fim de colocar as mãos num componente químico que transformará o planeta num lugar habitado por homens-plantas inspirado no caso do Monstro do Pântano. A única forma que Batman e o Asa Noturna encontram de controlar a dupla e localizá-la é recorrer a Arlequina, antiga parceira de Hera Venenosa agora em reabilitação após sair do Arkham e da "asa" do Coringa. Acontece que Arlequina é uma figura completamente imprevisível e, ao chamá-la para compor sua equipe investigativa, Batman acaba trazendo para si uma dupla função: conter os planos de Hera e vigiar sua nova parceira, se precavendo para o caso dela subitamente "virar a casaca".
Como um capítulo descompromissado e menor na grande saga do Batman contra os vilões de Gotham, apesar da ameaça instaurada por Hera e pelo Homem Florônico tomar proporções globais, Batman e Arlequina explora de maneira pontual a presença de Harley no lado dos mocinhos. A parceria com a personagem confere uma leveza ao Homem Morcego, transformando sua seriedade num curioso elemento cômico da história, como se, de fato, pela primeira vez o Batman conseguisse esboçar prazer nas suas aventuras, a ponto do Asa Noturna notar que a importância da Arlequina na missão vai além da necessidade de controlar e localizar Hera Venenosa. Ao mesmo tempo, os roteiristas conseguem encontrar uma justificativa plausível para o uso da Arlequina na história ao lado da dupla. A presença de Harley na aventura é orgânica à construção da trama investigativa e coerente com os rumos atuais da personagem nas suas histórias mais recentes nos quadrinhos, uma criminosa tentando se reabilitar e completamente avessa a seu relacionamento abusivo com o Coringa.
O longa de animação preserva a natureza instável da Arlequina, evitando transformá-la numa heroína, ao mesmo tempo em que consegue desenvolvê-la em camadas interessantes e contraditórias, mantendo sua natureza cômica e explorando-a nas doses necessárias. Novos elementos são inseridos, como sua relação com o Asa Noturna, algo que não ganha contornos mais complexos devido a natureza do material, mas que, como já sugerido, revela-se importante, inclusive, na transformação da dinâmica entre Dick Grayson e Batman, sempre tão sisuda e marcada pelo peso que o primeiro sente por achar que nunca atende às expectativas de Bruce Wayne, seu grande mentor. Ao mesmo, há tempo para a animação explorar a amizade entre Arlequina e Hera Venenosa, sobretudo no terceiro ato da história, e isso traz um novo sabor ao longa já que a parceria entre as personagens sempre rende histórias saborosas calcadas no espírito girl power que a união inspira.
Das animações da Warner sobre o universo DC, Batman e Arlequina não chega a ser a mais memorável de todas já lançadas, mas rende uma sessão descompromissada como um episódio esticado da extinta e querida Batman: The Animated Series. Ainda que sua existência se deva a razões puramente comerciais (explorar ao máximo o fenômeno popular que é a Arlequina, sobretudo depois do sucesso de bilheteria que foi Esquadrão Suicida), os seus envolvidos conseguiram encontrar uma forma criativamente interessante de fazer um produto vendável e sedutor para os fãs dos personagens em questão. Batman e Arlequina é, na verdade, um filme da Arlequina, mas ainda bem que contamos com mentes que realmente entendem a personagem como típica sidekick que só funciona na tela quando estabelece dinâmicas equilibradas com personagens que lhe são contraponto, daí o lugar do próprio Batman, Hera Venenosa, Asa Noturna na história.
Batman and Harley Quinn, 2017. Dir.: Sam Liu. Vozes de: Kevin Conroy, Melissa Rauch, Paget Brewster, Loren Lester, Kevin Michael Richardson, Eric Bauza, Trevor Devall, John DiMaggio, Robin Atkins Downes. Warner, 74 min.
Assista ao trailer do filme:
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