'Planeta dos Macacos: A Guerra' mostra como Hollywood pode ser adulta


É curioso observar um filme como Planeta dos Macacos: A Guerra e compará-lo com a lista corrente de títulos dos estúdios na temporada blockbuster. Já tratamos do assunto por aqui na ocasião da estreia de Em Ritmo de Fuga do Edgar Wright, falávamos sobre como esses grandes títulos do cinemão têm se homogeneizado. Ao final de Planeta dos Macacos: A Guerra, no entanto, chego a conclusão de que não é somente a homogeneização na execução que tem empobrecido esses longas, mas a falta de maturidade no enfrentamento das suas tramas tem sido letal ao cinema blockbuster recente, cada vez mais juvenil não apenas em suas temáticas, mas no desenvolvimento delas.

Desde 2011 quando Rupert Wyatt nos apresentou Planeta dos Macacos: A Origem iniciando uma trilogia prequel da franquia iniciada nos anos de 1960 com Charlton Heston entre suas estrelas, a trajetória do símio César se mostrou para o espectador como uma trama que conseguia oferecer entretenimento para o público, afinal é para isso que esses filmes são feitos, sem subestimar sua inteligência e sentimentos. Enquanto parte das franquias e suas necessidades compulsivas de estabelecer universos interligados têm cada vez mais se tornado produtos eminentemente infantis ou adolescentes, com pouquíssima coragem para esgarçar suas tramas e a trajetória de seus personagens, a nova trilogia Planeta dos Macacos mostrou que é possível aos grandes estúdios realizarem filmes adultos sem comprometer o entretenimento, deixar de ter algo a dizer de relevante sobre a sociedade ou anular a ambição artística de seus cineastas.

Em Planeta dos Macacos: A Guerra, César e seu grupo ainda colhe o resultado dos eventos do último longa Planeta dos Macacos: O Confronto, no qual o símio dissidente Koba traiu o seu líder e iniciou um confronto aberto com os seres humanos. No terceiro filme da franquia, César enfrenta o exército de um coronel interpretado pelo ator Woody Harrelson (de Truque de Mestre) que quer colocar um fim na existência dos macacos na Terra. Após uma operação bárbara do personagem de Harrelson, César parte em busca de vingança e acaba colocando em rota de colisão o destino da humanidade e dos macacos. 


Como acontece desde Planeta dos Macacos: A Origem, Planeta dos Macacos: A Guerra dá continuidade a algumas proposições temáticas que são a base da franquia, a principal delas é compreender os meandros da natureza humana a partir da situação distópica que os filmes propõem quando os símios são capazes de gestos de humanidade muito mais latentes do que os próprios seres humanos ou mesmo quando alguns homens são capazes de atos que fazem justiça a sua condição, o que traz um pouco de esperança para a nossa espécie (tivemos isso com James Franco em A Origem, Jason Clarke em O Confronto e em A Guerra a responsável por isso é a garota Amiah Miller). Tecnicamente o longa também segue o êxito dos demais títulos da franquia com a exaustivamente bradada qualidade na concepção dos macacos da história, o que envolve não apenas a computação gráfica, mas também as performances de Andy Serkis e outros atores capturadas por programas de computador e impressas na tela com uma expressividade impressionante (atenção também para o macaco de zoológico Bad Ape de Steve Zahn), algo que só contribui para o eco da narrativa com o público afinal é essencial que esse se envolva emocionalmente com os eventos dramáticos que ocorrem na trajetória do seu herói, o símio César. 

Ocupando o posto de diretor desde Planeta dos Macacos: O Confronto e prestes a assumir a trilogia The Batman na Warner, Matt Reeves também exibe nesse capítulo as mesmas qualidades que demonstrou no longa anterior. Reeves consegue construir um arco dramático crescente, pontuando suas cenas de ação com estratégias visuais estética e narrativamente inventivas, mas também oferecendo à história muita emoção em momentos certeiros, sem que para isso force sentimentos no espectador. O conflito de César é palpável e, pela execução do diretor, é muito difícil não se envolver com o percurso do seu personagem principal, torcer e se emocionar com tudo aquilo que ele vive. 

Há, contudo, algumas questões que empalidecem esse terceiro capítulo em comparação com os anteriores, mas nada que o torne um longa desastroso, mas talvez menos palatável de se assistir que os demais, que a despeito da atmosfera carregada que exibiam, conseguiam exibir alguns momentos de leveza. Talvez a constância do tom pesado ocorra aqui por características da própria proposta de Planeta dos Macacos: A Guerra, que nunca quis nos mostrar uma situação que reverbera num confronto climático entre os seus personagens, como os títulos anteriores, mas trazer um planeta onde seus habitantes estão extremamente cansados por anos e anos de conflito. Diferente de Planeta dos Macacos: O Confronto, por exemplo, o confronto bélico não está somente no final do filme, nem preenche toda a projeção, ele opera como um fantasma que deixa sua atmosfera mais down.  

O tom que tratamos anteriormente faz com que Planeta dos Macacos: A Guerra acabe incorporando em sua própria execução uma atmosfera de cansaço. Os personagens e aquele mundo estão tomados por uma exaustão do estado de guerra que é mais do que natural, mas que acaba refletindo em um filme que dá sinais fadiga, de ressaca. Com isso, o que o público verá na maior parte da projeção de Planeta dos Macacos: A Guerra é uma atmosfera predominantemente triste, pálida e num ritmo mais arrastado que o usual para a franquia. Entendam, trata-se de um resultado absolutamente coerente com o estágio da trajetória de César que o filme nos pontua, só não sei se isso proporciona uma melhor experiência ao público que os dois títulos anteriores.

Ao menos que sejamos surpreendidos com um anúncio da Fox em sentido contrário, Planeta dos Macacos: A Guerra encerra uma trilogia com uma natural mudança de tom, mas sem dever muito ao público pois tudo que apresenta no terceiro capítulo da jornada de César é perfeitamente coerente com o que fora estabelecido seis anos atrás.  Dosando a urgência de sua trama distópica com um desfecho digno para o arco dramático do seu herói iniciado com Planeta dos Macacos: A Origem, Planeta dos Macacos: A Guerra traz lições de execução que poderiam ser repetidas com mais frequência por chefões dos estúdios de Hollywood. 

War for the Planet of the Apes, 2017. Dir.: Matt Reeves. Roteiro: Mark Bomback e Matt Reeves. Elenco: Andy Serkis, Woody Harrelson, Steve Zahn, Karin Konoval, Amiah Miller, Terry Notary, Ty Olsson, Judy Greer, Gabriel Chavarria, Sara Canning. Fox, 140 min. 

Assista ao trailer do filme: 

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Chovendo Sapos: 'Planeta dos Macacos: A Guerra' mostra como Hollywood pode ser adulta
'Planeta dos Macacos: A Guerra' mostra como Hollywood pode ser adulta
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