Entre os dias 09 e 16 de fevereiro acontece em Salvador e Cachoeira o XII Panorama Internacional Coisa de Cinema com um catálogo diversificado de títulos que disputam a atenção do público em sessões que acontecem no Espaço Itaú de Cinema Glauber Rocha, na Sala Walter da Silveira e no Cine Theatro Cachoeirano. Exibições disputadas como as de Cinema Novo, premiado documentário de Eryk Rocha, O Ornitólogo, de João Pedro Rodrigues, que, inclusive, abriu a edição, estão entre as pedidas, mas a dica é para que o público preste atenção também em alguns títulos não tão visados que estão na programação do festival, eles podem trazer boas surpresas. Entre longas de ficção, curtas e documentários, selecionei alguns.
Martírio
O documentário dirigido por Vincent Carelli, que já tem toda uma trajetória como indigenista, conta a saga dos guarani-kaiowá pelo direito a suas terras no Mato Grosso do Sul. O filme agarra o espectador de jeito com um retrospecto histórico das tribos na região e sua triste e longa trajetória de resistência contra a truculência do homem branco que, por décadas, realizou esforços de apagamento da sua existência e identidade na região. O longa dá conta como pesquisa e relato sensível do seu objeto, através de uma marcante narração de Carelli que dimensiona sua experiência humana e espiritual com os guarani-kaiowá. Do significado da terra para o povo indígena e da duvidosa relação com a propriedade que governa os poderes em Brasília através da bancada ruralista e no interior do país por intermédio dos grandes proprietários de terra e daqueles que defendem os seus interesses, Martírio é uma impactante reflexão sobre diferentes valores conferidos a um mesmo objeto. Enquanto para os índios a terra é elemento de preservação da sua cultura, para o branco ela é "propriedade", anunciada por um fazendeiro em dado momento do filme como aquilo que ele tem de mais precioso. Ao expor estas duas percepções em processo de tensão e jogo de forças desiguais, Martírio é um filme importante e que merece ser visto na primeira oportunidade que passar por um circuito mais amplo. O filme foi exibido na abertura do festival, juntamente com O Ornitólogo.
Urutau
O longa aborda um tema complicado como a pedofilia através da história de Fernando, um jovem que está há sete anos em cativeiro por ação de um professor de meia idade que o força a se comportar como criança e com quem mantém relações sexuais. A temática é dura e o diretor Bernardo Cancella Nabuco aborda tudo pela perspectiva do rapaz, captando suas reações àquela espinhosa experiência. O título do filme faz referência a uma ave conhecida por mitos que giram em torno de pedidos melancólicos de socorro, pela rejeição e pela ausência de sorte no seu destino.
Talvez Deserto Talvez Universo
Os cineastas Karen Akerman e Miguel Seabra Lopes passaram um tempo em uma instituição psiquiátrica forense e realizaram esse documentário que tem como intuito investigar a ausência de consciência contrastada com a riqueza do universo particular dos internos do local. Os diretores acertam ao evitar maiores interferências naquela realidade, inclusive ao optarem pelo preto e branco na fotografia para evitar a distração das cores. Tudo o que resta é o vazio do tempo, da perspectiva de vida e dos olhares.
A Moça que dançou com o Diabo
O curta do paulista João Paulo Miranda Maria conta a história de uma menina de família evangélica "tentada" pela pregação constate do contexto que a cerca. Entre clamores religiosos em praça pública e sessões de exorcismo exibidas na TV durante o almoço, aquilo que mais se nega (o diabo) é o que está mais presente em sua vida. Isso é cumulado com o próprio processo de descoberta da garota, que passa a perceber a tensão entre a sua criação familiar e os seus verdadeiros desejos. O realizador trata a história com muito humor para falar de um processo de revolução particular quando contrariamos as próprias expectativas de criação.
Para mais informações sobre a programação do Panorama, acesse o site!
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