Deadpool



Antes de ganhar o seu primeiro filme-solo, Deadpool havia aparecido em X-Men Origens - Wolverine  como parte de um dos capítulos mais infelizes da trajetória do mutante interpretado por Hugh Jackman nos cinemas. Wade Wilson, um dos personagens mais politicamente incorretos da Marvel, conhecido por suas tiradas irônicas e repletas de senso de humor, fora silenciado pelos realizadores do primeiro filme-solo de Wolverine, tendo sua boca completamente lacrada após um experimento científico. A equivocada personificação do "herói" nas telas em X-Men Origens - Wolverine , no entanto, não impediu que o projeto de um filme protagonizado pelo Deadpool fosse iniciado nos bastidores da Fox e, oito anos após o desastre o longa, Deadpool chega aos cinemas fazendo jus ao espírito irreverente do personagem das HQs. O longa que chega aos cinemas em 2016 é tudo o que prometera desde que o primeiro trailer do filme saira na Comic-Con do ano passado: nunca se leva a sério e firma-se como um dos filmes de super-heróis mais "retardados" do ano (e isso é um elogio).

Em Deadpool acompanhamos a transformação do ex-militar e mercenário Wade Wilson, interpretado por Ryan Reynolds, em um mutante com poderes de regeneração após ter o seu corpo transfigurado em uma falsa tentativa de cura de um câncer em estágio terminal. Ao descobrir que havia sido enganado por aqueles que lhe prometeram a cura da doença, Wade Wilson assume a identidade de Deadpool e parte em busca de vingança contra aqueles que destruíram a sua vida.

Seguindo a linha das adaptações de HQs que não se levam a sério, como Guardiões da Galáxia e Homem - Formiga, porém em um nível de sarcasmo ainda mais acentuado, Deadpool é um longa marcado pela anarquia. Deadpool é um filme que não poupa nenhum dos estratagemas narrativos dos filmes de super-heróis  e de humor tão corrosivo  que tira sarro do seu próprio astro, o ator Ryan Reynolds, caçoado pelo diretor Tim Miller e companhia por suas desastradas aparições em outros longas do filão cinematográfico como Lanterna Verde e o próprio X-Men Origens - Wolverine e sua fama de ator canastrão. Essa habilidade de encontrar o absurdo e apontar o dedo para os "calcanhares de Aquiles" do seu próprio nicho fazem de Deadpool um longa que não tem medo de romper quartas paredes e que sempre pega o espectador de surpresa com insights corajosos sobre o próprio "gênero" no qual está inserido.

Essa "coragem" de Tim Miller e de todos os envolvidos em Deadpool faz jus ao próprio personagem e enchem de viço o circuito cinematográfico, fadado a um certa repetição na abordagem das narrativas mitológicas dos super-heróis, grupo que, aliás, Wade Wilson faz questão de dizer que não faz parte. Nesse sentido, os méritos dessa empreitada bem-sucedida precisam ser creditador ao seu diretor, seus roteiristas Rhett Reese e Paul Wernick e ao seu protagonista Ryan Reynolds, que assume sem pudores e limites os extremos de um personagem tão politicamente incorreto quanto Deadpool.

Todavia, é preciso destacar que o mesmo tom sarcástico que faz de Deadpool um projeto único em meio a tantas adaptações de HQs de super-heróis que proliferam no circuito comercial é também a sua grande fragilidade. Diferente de longas como Guardiões da Galáxia ou Homem-Formiga nos quais o humor é um elemento orgânico dentro de uma trama que tem uma consistência dramática e narrativa, Deadpool é um "carro em alta velocidade desgovernado". O longa de Tim Miller funciona mais como uma irreverente paródia de filmes de super-heróis que não poupa nem mesmo os momentos de maior introspecção, dramaticidade ou tensão do personagem, como no momento em que o protagonista descobre seu câncer ou toma ciência de que fora enganado pelos vilões do filme e suas promessas de cura para a doença através de um arriscado experimento científico. Assim, tudo vira motivo de piada, e, preciso confessar, muitas delas soam sem graça já que são vomitadas incessantemente pelo longa.

Há que se notar o seguinte: o Deadpool, de Tim Miller é um filme de humor tão ácido, corrosivo e auto-referente que em dados momentos chega a ser excessivo. Apesar do longa ter o mais elevado compromisso com o divertimento desde o início da sua projeção, quando vemos os hilários créditos de abertura, até a cena pós-créditos finais, executando sua promessa com o público muito bem, tem momentos que o filme de Tim Miller perde o fio da meada e determinadas piadas soam cansativas. Tudo bem que Deadpool, o filme e o personagem, não se leva a sério, mas qualquer trama de humor anárquico precisa de momentos de respiro e "seriedade" nos quais a comédia torna-se orgânica à trama, fazendo com que as piadas tenham o seu grande momento com a plateia. Existem determinados momentos em Deadpool que estamos tão cansados da sua avalanche de gags por segundo que passamos a não nos importar e nem achar graça. Não é desejar que Deadpool seja um filme sério - ele não deve ser -, mas falta ao longa a sabedoria de compreender que um pouquinho de moderação no seu anseio de desejar a todo custo ser cool ao quebrar todos os protocolos e convenções de um gênero não lhe faria mal. Assim, como diagnóstico, talvez Deadpool só não seja um filme melhor do que é - e ele é um filme bem divertido - pelas suas doses cavalares de anarquia, curiosamente, algo que lhe confere singularidade na indústria.




Deadpool, 2016. Dir.: Tim Miller. Roteiro: Rhett Reese e Paul Wernick. Elenco: Ryan Reynolds, Morena Baccarin, Ed Skrein, T.J. Miller, Karan Soni, Brianna Hildebrand, Gina Carano, Stefan Kapicic, Michael Benyaer, Kyle Cassie. Fox, 108 min. 

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Chovendo Sapos: Deadpool
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