Costuma-se dizer que o universo sombrio e realista da trilogia O Cavaleiro das Trevas e dos X-Men,
de Christopher Nolan e Bryan Singer, respectivamente, influenciou todos os filmes de
super-heróis que os sucederam. De repente, todo longa protagonizado por
indivíduos com super-poderes precisam justificar sua urgência colocando
seus personagens em dramas existenciais e associações com problemas
políticos e sociais como o terrorismo, o preconceito etc. Muitas vezes isso
não é necessário, já que Batman e o grupo do Professor Xavier se
apresentam assim porque seus contextos exigem isso deles. Em muitos
casos, a única coisa que se exige desses longas é que eles entretenham e
embarquem no teor fantástico de suas respectivas premissas, claro que
tudo isso obedecendo às “regras” básicas de qualquer filme
: desenvolvimento de personagens,
dinamicidade do roteiro e apuro técnico. Afinal, entretenimento não
significa burrice ou desleixo. Dito isso, vamos a As Tartarugas Ninja, um filme que preferiu buscar a inspiração em toda sorte de histórias de super-heróis, menos na sua própria origem.
O novo longa baseado nos icônicos personagens de Peter Laird e Kevin
Eastman retoma a gênese dos heróis, tartarugas mutantes com incríveis
habilidades para técnicas de luta oriental que vivem no esgoto e atuam
clandestinamente como vigilantes em Nova York. Eles são descobertos pela repórter de
TV April O’Neil, que enxerga neles a sua chance de ser levada a sério no
trabalho, deixando de cobrir pautas frívolas de entretenimento. No
entanto, April descobre que Michelangelo, Raphael, Leonardo e Donatello
têm uma conexão com o seu passado e com o trabalho do seu falecido pai.
Produzido por Michael Bay, diretor responsável pela franquia Transformers, entre outras bombas cinematográficas, As Tartarugas Ninja foi dirigido por Jonathan Liebesman, de Invasão do Mundo – Batalha de Los Angeles e Fúria de Titãs 2, mas isso é um mero detalhe. Do início ao fim, As Tartarugas Ninja se
apresenta como um autêntico produto “Michael Bay”, exibindo as marcas questionáveis
da filmografia do diretor, desde a inserção nada
discreta da publicidade, como no momento em que o mestre Splinter
oferece aos tartarugas uma pizza de uma cadeia de restaurantes famosa em
todo o mundo, até o machismo que costuma pontuar a passagem de suas personagens
femininas na história, em dado momento de extremo perigo, por exemplo, eles têm
tempo de fazer uma “brincadeira” com o traseiro de April O’Neil, uma
Megan Fox que, por sinal, surge visualmente impecável
nos momentos menos propícios como se estivesse participando de uma propaganda de cosméticos. Somam-se a isto as corriqueiras extensas e
hiperbólicas sequências de ação típicas dos filmes de Bay e os movimentos de câmera aleatórios do realizador, como a insistência da câmera filmar os
seus personagens de cima para baixo sem a menor
justificativa.
Contudo, o que mais incomoda em As Tartarugas Ninja é o fato
do filme se levar a sério demais. Tendo como protagonistas tartarugas
(!), ninjas (!!), mutantes (!!!), adolescentes (!!!!) apaixonadas por
pizza (!!!!!) e treinadas por um rato que as adota como pai (!!!!!!!!!)
era de se esperar que o longa utilizasse isso a seu favor e “brincasse”
mais com o espectador e com o próprio universo, como a série animada e
os filmes anteriores faziam. No entanto, Bay e Liebesman preferem
transformar As Tartarugas Ninja em um filme sombrio com um leve teor trágico, ou seja, erraram por completo no tom da história. Pegaram pesado demais.
As Tartarugas Ninja , no final das contas, acaba sendo um
projeto sintomático de uma prática recorrente entre realizadores
cinematográficos e estúdios. Os envolvidos na adaptação de um clássico
da nossa infância preferiram olhar para o que já deu certo em outros
contextos, sem levar em consideração que esses filmes que se tornaram
referência no universo dos super-heróis tiveram êxito porque atenderam
a demandas do próprio material que tinham em mãos. Se Michael Bay e
Jonathan Liebesman voltassem seus olhos para As Tartarugas Ninja em
primeiro lugar e não para o que está fora do projeto, talvez
concebessem um filme que, no mínimo, nos fizesse lembrar da essência da
história original.
COMENTÁRIOS