A geração beat foi um movimento literário que tomou impulso
no final da década de 1950 e início dos anos de 1960. Cansados do
excesso de veneração a canônes e valores conservadores da cultura
norte-americana, um grupo de jovens rompeu com os padrões vigentes
através de uma produção intelectual inspirada. Movidos a jazz, drogas e
sexo livre esses escritores produziam compulsivamente e apresentavam uma
narrativa intensa, com fluxo de pensamento desalinhado, abusando do
emprego de gírias e palavrões. Participaram desse movimento o poeta
Allen Ginsberg (de Howl), o escritor William Burroughs (Naked Lunch) e, claro, Jack Kerouac (que imortalizou Neal Cassady como um herói para a geração da segunda metade do século passado em On The Road). Mais tarde, esse grupo se revelaria como a inspiração para a geração de
ouro de cineastas norte-americanos da década de 1970 e bandas como os
Beattles e o The Doors, por exemplo.
Versos de um Crime mostra a gênese do movimento
personificada na figura de Lucien Carr, um jovem com pouco talento mas
muita rebeldia que acaba inspirando essas três figuras da geração beat,
Allen Ginsberg, William Burroughs e Jack Kerouac, em especial Ginsberg,
com quem Carr teve um breve mas intenso romance. Carr foi o responsável
por inspirar os três escritores a se tornarem quem são hoje, utilizando
as potencialidades dos três para materializar em verso e prosa o
espírito beat. No entanto, Carr se envolveria em uma trama de
assassinato que acabou fragilizando a perpetuação das relações do grupo e
cada um seguiu o seu próprio caminho.
O filme de John Krokidas é bastante linear e pouco inventivo como
narrativa audiovisual. O realizador se apoia no interesse natural do
espectador pela história, que é mantido graças aos nomes envolvidos na
sua trama (Ginsberg, Kerouac e Burroughs) e não aos esforços dele como
cineasta. Versos de um Crime mantém a preocupação com a gênese do fenômeno cultural beat
e não consegue passar em imagens o espírito do grupo. Fazendo uma
inevitável comparação, Walter Salles conseguiu, com toda a simplicidade
que lhe é inerente, trazer para o seu Na Estrada a falta de linearidade, o pensamento pulsante e a atmosfera libertária da produção beat. Versos de um Crime não
consegue dar conta de demandas que deveriam ser atendidas para além da
simples execução de um roteiro. Krokidas não chega a comprometer o longa
com essa decisão, apenas o torna menos interessante do que poderia ser.
Daniel Radcliffe até que se esforça como Ginsberg (sim, esforço é a
palavra certa para esse caso), mas Dane DeHaan (atenção para esse rapaz
pois em breve ele viverá James Dean) chama o filme para si como o
instável Lucien Carr. Ben Foster também está ótimo como William
Burroughs, assim como Jack Huston na pele de Kerouac. Há participações
pontuais de veteranos como Jennifer Jason Leigh (interessante como a mãe
de Ginsberg), Kyra Sedgwick e Michael C. Hall, como David Krammerer, a
vítima de Carr. Elizabeth Olsen, por sua vez, é subaproveitada como a
esposa de Kerouac, o que é uma pena.
Versos de um Crime é um filme “quadradinho” e linear demais
para retratar (ou introduzir) para a audiência do cinema (sempre muito
diversificada) o que representou a geração beat. Apesar de
trazer o embrião do movimento, John Krokidas não se preocupou em
traduzir em imagens as características da escrita do grupo, o que seria
essencial para torná-lo uma obra viva e menos banal do que ela acaba
sendo. No final, Versos de um Crime se torna apenas um capítulo
burocrático e didático, como essas páginas de armazenamento de
curiosidades sobre um determinado fenômeno, personalidade ou obra que a
gente encontra na Internet. Como obra cinematográfica poderia se
inspirar pelo menos um pouco na subversão dos seus protagonistas.
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