A gênese do ídolo

Somos tão Jovens é um filme satisfatório, mas Antonio Carlos da Fontoura opta pelo convencional ao contar o início da carreira de Renato Russo


O cinema por suas características intrínsecas, pela complexidade de profissionais e áreas que abrange, já é uma atividade artesanal que mexe com a paciência do seu realizador. No Brasil então, a atividade parece exigir doses cavalares de "chás de cadeira", doses mais fortes que o usual. Somos tão Jovens está há alguns anos na fila de espera por uma brecha em nosso competitivo e apertado calendário cinematográfico para chegar ao público brasileiro. O filme sobre a formação musical de Renato Russo e a origem da Legião Urbana teve parte do elenco contratada em 2009, incluindo aqui o protagonista Thiago Mendonça. As filmagens aconteceram somente no final de 2011 e, de lá para cá, o período de pós-produção durou um ano e meio! Todo esse tempo gasto resultou em um filme que só vemos estrear nas salas de todo o país nesse início de maio, disputando bilheterias com o trator Homem de Ferro 3.

Ao menos a espera compensa por vários motivos, ainda que o filme não possua nem um terço da verve incendiária do próprio biografado. Explico, Somos tão Jovens opta por um estilo padronizado de narrativa para não aborrecer públicos mais conservadores, evitando também qualquer flerte com temas polêmicos relacionados à vida do músico. E pode-se falar qualquer coisa sobre Renato, menos que ele era um cara que gostava de padrões, pelo contrário, ele os evitava. Apesar do descompasso e de todo o "bê-a-bá" esperado para uma convencional biografia cinematográfica o filme é marcado por certos esforços do diretor Antonio Carlos da Fontoura que merecem destaque.

O tom declamatório e didático dos diálogos (os personagens têm a tendência a explicar todo e qualquer ato ou pensamento para o espectador) sai da boca de um elenco jovem absolutamente comprometido e envolvido com o projeto. Thiago Mendonça é um ator de sensibilidade à flor da pele e compõe um Renato Russo com admiração, inquietação e profundidade. O ator é uma escolha acertada não só por sua impressionante semelhança física ( o que, particularmente, sempre acho menos relevante nessas escalações), mas por sua dedicação e por seu comprometimento. Mendonça procurou estudar não só a vida de Renato, mas toda a forma com que o artista se expressava na música, uma trabalho cheio de honestidade e dignidade. Outro destaque do jovem elenco é Laila Zaid, intérprete de Ana, melhor amiga e confidente de Renato, mulher que serviu de inspiração para ele compor "Ainda é cedo". A atriz é absolutamente encantadora, praticamente não dá para competir com ela em cena, nem mesmo Mendonça consegue.

Fora o esforço do elenco, que ainda conta com Sandra Corveloni como a mãe do protagonista, o filme traça muito bem o repertório de influências e referências de Renato Russo (o punk rock britânico, os Beatles etc.), assim como também oferece uma panorâmica do cenário roqueiro de Brasília nos anos de 1980 (Plebe Rude, Capital Inicial, além dos seus próximos como Paralamas do Sucesso).  Contando os primeiros anos de Renato Russo, Somos tão Jovens pode não ser um dos filmes mais ousados do recente repertório cinematográfico nacional, a condução do veterano Antonio Carlos da Fontoura transforma um longa que aborda a juventude em uma narrativa "quadradona", preocupada com didatismos e com a cronologia dos fatos. No entanto, o afeto que temos por seu protagonista, pelo que ele representa para a sua geração e a dedicação do elenco torna Somos tão Jovens um filme especial. Provavelmente, o longa será o ponto de partida para que uma geração que não conheceu Renato Russo e a Legião Urbana passe a conhecê-los melhor. E quem sabe a nossa geração Coca Zero aprenda alguma coisa com as letras da geração Coca-Cola do Renato? Somos tão Jovens é um bom começo.



Somos tão Jovens, 2013. Dir.: Antonio Carlos da Fontoura. Roteiro: Marcos Bernstein. Elenco: Thiago Mendonça. Laila Zaid, Sandra Corveloni, Marcos Breda, Bianca Comparato, Bruno Torres, Conrado Godoy, Olívia Torres, Henrique Pires, Nicolau Villa-Lobos. 104 min. Imagem Filmes.

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Chovendo Sapos: A gênese do ídolo
A gênese do ídolo
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