Elenco internacional é a tônica de 360, um mosaico de personagens com altos e baixos
Depois de dramas com intenso engajamento político e social, como Ensaio sobre a Cegueira, O Jardineiro Fiel e, claro, Cidade de Deus, Fernando Meirelles resolve apostar em um longa mais intimista, preocupado com as pessoas que são retratadas na tela e seus dramas. Nas palavras do próprio cineasta, 360 é um pequeno filme. Talvez a categorização de Meirelles esteja cheia de modéstia ou tente suavizar os equívocos desse longa aos olhos dos críticos - os estrangeiros já reprovaram o filme em alguns festivais. Em todo caso, 360 é um filme ambicioso no que diz respeito às pretensões do roteirista Peter Morgan, que já escreveu trabalhos primorosos como A Rainha e Frost/Nixon, ao tentar, através de um mosaico de personagens, conferir uma unicidade a todas as tramas paralelas retratadas, uma unicidade que muitas vezes só existe nas palavras do roteiro e não na tela.
360 segue a vida de diversos personagens, cujas ações interferem na vida uns dos outros sem que necessariamente se conheçam. Assim, uma prostituta eslovaca marca um programa com um executivo inglês, que por sua vez tem uma esposa que mantém um relacionamento com um fotógrafo brasileiro que tem uma namorada também brasileira e que conhece um senhor que está prestes a ir aos EUA em busca de sua filha desaparecida há muitos anos. A ideia de Morgan e Meirelles é mostrar que o mundo e que as pessoas estão interconectadas e cada vez mais distantes. Uma ideia que mostra-se um pouco frágil se levarmos em consideração que há outros filmes contemporâneos que exploraram esse tipo de abordagem, como Babel e o incipiente Crash - No Limite.
O grande problema é que 360 conta com um segmento que faz o filme cair um pouco em descrédito. Ele é protagonizado pelos personagens de Maria Flor (uma pena, porque Flor merecia uma grande estreia internacional), Anthony Hopkins e Ben Foster. A personagem de Flor é excessivamente crédula e toma decisões inverossímeis e incoerentes, sobretudo se pensarmos no contexto em que a conhecemos. Contudo, 360 tem um ótimo desfecho, um núcleo formado por um motorista russo à serviço de um empresário rico e perigoso que contrata a prostituta eslovaca que mencionamos no parágrafo anterior. O segmento é protagonizado por Vladimir Vdovichenkov e Gabriela Marcinkova, que interpreta a irmã da garota de programa em questão, incríveis em cena. Os melhores desempenhos do filme são de Vdovichenkov e Marcinkova, junto com o de Ben Foster, que apesar de protagonizar um núcleo mal desenvolvido, faz a composição primorosa de um ex-condenado por crimes sexuais tentando manter-se afastado das "tentações" da sociedade.
Voltando ao último núcleo de personagens mostrado em 360, há um momento em que Marcinkova lê uma carta que sua personagem escreve para a irmã falando sobre caminhos bifurcados e as escolhas que fazemos em nossas vidas. Aqui, o roteiro de 360 parece encontrar um eixo original e satisfatório para sua trama, mostrando que mais que um mosaico de personagens de diversas nacionalidades que comprovam na prática o já excessivamente explorado "efeito borboleta", o filme quer falar sobre as escolhas que fazemos e as consequências que elas geram na vida de outras pessoas.
Além disso, o longa explora muito bem recursos como montagem e fotografia em prol da narrativa. Há um momento interessantíssimo no longa no qual somos apresentados à personagem de Rachel Weisz e seu caso amoroso com o brasileiro vivido por Juliano Cazarré. Meirelles explora muito bem a utilização do som e da fotografia para mostrar a culpa da personagem após protagonizar uma intensa cena de sexo com o amante - o barulho do casal na cama cede lugar para o silêncio reflexivo dela, sozinha no mesmo lugar. Aqui a montagem de Daniel Rezende também é fundamental, realizando cortes que dimensionam os sentimentos dos personagens e outros que conferem um ritmo ágil ao longa.
Entre altos e baixos, os bons momentos de 360 acabam compensando as fragilidades do filme na construção de sua conclusão. No entanto, é interessante notar que, com um elenco com nomes como os de Anthony Hopkins, Rachel Weisz e Jude Law, o filme traga como núcleo mais coeso aquele protagonizado por uma atriz eslovaca e um ator russo. Isso jamais deve ser encarado como surpresa, o propósito de Fernando Meirelles com sua carreira de agora em diante é exatamente este, trazer uma equipe com integrantes de diferentes nacionalidades, experiências e visões de mundo, o que para um set cinematográfico acaba sempre proporcionando experiências riquíssimas. 360 é uma delas apesar dos deslizes. Um filme representativo na carreira de um cineasta que aposta sempre na diversidade de olhares.
360, 2012. Dir.: Fernando Meirelles. Roteiro: Peter Morgan. Elenco: Anthony Hopkins, Rachel Weisz, Jude Law, Maria Flor, Ben Foster, Juliano Cazarré, Vladimir Vdovichenkov, Gabriela Marcinkova, Dinara Drukarova, Marianne Jean-Baptiste, Lucia Siposova, Danica Jurcová, Mark Ivanir, Djemel Barek, Sydney Wade, Tereza Srbova. 110 min. Paris Filmes.
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