Sombras da Noite
Tim Burton já perdeu os prumos de sua carreira há algum tempo. Seus últimos filmes sofrem com os excessos das extravagâncias do cineastas e da pouca substância de suas tramas. É o caso de Alice no País das Maravilhas e Sweeney Todd - O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet, por exemplo. O último filme memorável do cineasta está pelos idos de 2003, Peixe Grande e suas Histórias Maravilhosas, e olha que aqui ele nem conta com a ajuda de seu parceiro habitual, o ator Johnny Depp, que por sinal anda se repetindo já faz algum tempo. Sombras da Noite é um caso à parte. Neste novo trabalho, o equívoco fica por conta da incapacidade do diretor Burton e do roteirista Seth Grahame-Smith em lidar com múltiplos personagens e tramas. Ainda que preserve o espírito da série de TV original, praticamente não vista no Brasil, como muitos dizem, falta a Sombras da Noite um pouco de coesão. No entanto, não dá para negar que o filme possui um dos elementos que faltava em alguns dos recentes trabalhos de Burton: a interessante combinação entre a personalidade do diretor nos personagens e narrativas e o auto-controle nos elementos visuais. Tudo o que seus piores filmes não souberam fazer.
Em Sombras da Noite, Tim Burton conta a história de Barnabas Collins, um homem amaldiçoado por uma bruxa que o condena a dor eterna ao transformá-lo em vampiro. A feiticeira chama-se Angelique e é tomada por uma fúria incontrolável quando Barnabas a rejeita e se apaixona por uma outra jovem. Após o feitiço, Angelique convoca todos da cidade a aprisionar Barnabas para sempre em um caixão. Duzentos anos depois, Barnabas acorda em plena década de 1970 e decide quebrar sua maldição e ajudar os descendentes de sua família a reerguerem os negócios dos Collins. Porém, Angelique retorna e move esforços para impedí-los.
Jackie Earle Haley e Johnny Depp em Sombras da Noite. |
Sombras da Noite poderia ser um grande retorno de Tim Burton a um terreno que conhece como ninguém, àquele do humor protagonizado por personagens excêntricos e excluídos de alguma forma da sociedade. De certa maneira, Burton sente-se próximo desse tema e isso, ocasionalmente, o inspira a realizar obras de cunho autoral e emotivas, como Edward Mãos de Tesoura e Peixe Grande, ou divertidamente descompromissadas, como A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça e Ed Wood. No caso, Sombras da Noite aproxima-se mais do segundo grupo, mas é prejudicado pelos mesmos motivos que tornaram Marte Ataca! um filme complicado de ser engolido. Há presonagens demais, tramas paralelas demais e pouca resolução ou ligação entre elas, ou seja, o filme acaba ganhando um teor episódico.
Há interpretações interessantes. O próprio Depp está muito bem como Barnabas Collins, rendendo ótimos momentos ao salientar que o vampiro é um indivíduo completamente deslocado no tempo. As piadas sobre a falta de timing de Barnabas com o século XX, em especial a década de 70, geralmente são as melhores do longa. Quem também rende ótimos momentos é Eva Green, que na pele da bruxa Angelique praticamente rouba a cena de Depp em diversos momentos. Green exagera na tinta e isso é sempre muito interessante para uma vilã do universo de Tim Burton. Michelle Pfeiffer, em sua segunda parceria com o diretor que a tornou ícone como a Mulher-Gato de Batman - O Retorno, surge discreta como a matriarca dos Collins e Helena Bonham Carter é uma interessante distração como uma psiquiatra contratada pela família.
Barnabas observa pouco confiável Roger Collins, personagem de Jonny Lee Miller. |
O longa ainda não marca o retorno de Tim Burton aos bons filmes. Sombras da Noite possui mais arestas do que seu próprio realizador desejava. Quem se beneficia é Johnny Depp que, apesar de ser sempre mais interessante quando evita tipos e interpreta figuras mais humanas, consegue ser um dos poucos atores que captam a essência weird do diretor. Ainda assim é louvável que Tim Burton consiga realizar uma obra que desde o início tem consciência do que realmente é. Sombras da Noite tem muito mais o tom arrojado de Beattlejuice que a sensibilidade de um Edward Mãos de Tesoura. Mesmo assim, não custava nada priorizar determinados personagens e tramas em detrimento de outros. Ou seja, Burton progrediu, mas não foi dessa vez que ele mostrou seu vigor como cineasta.
Dark Shadows, 2012. Dir.: Tim Burton. Roteiro: Seth Grahame-Smith. Elenco: Johnny Depp, Michelle Pfeiffer, Eva Green, Helena Bonham Carter, Chloe Moretz, Bella Heathcote, Jackie Earle Haley, Jonny Lee Miller, Gulliver McGrath, Christopher Lee, Alice Cooper. 113 min. Warner.
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