O Exótico Hotel Marigold

Judi Denchi e Celia Imrie em O Exótico Hotel Marigold.

A contemporaneidade - não tenho certeza se é exigência exclusiva dos novos tempos, mas não há dúvidas de que é uma "filosofia intensificada na era da imagem - tem a tendência de valorizar o jovem e o belo. A velhice é uma faceta da vida que tendemos ignorar por medo. No cinema, não poderia ser diferente. O número de produções protagonizadas por atores maduros vai diminuindo conforme a idade avança. Assim, este núcleo de profissionais caem no ostracismo e é bem mais fácil para o público reconhecer Ashton Kutcher na rua que o elenco de O Exótico Hotel Marigold, ainda que o último soterre Kutcher na mais completa vergonha com técnica, talento e número de prêmios. Assim, o longa carrega por si só o mérito de reunir protagonistas cuja soma de suas idades certamente ultrapassaria a casa dos três dígitos. O filme é ainda mais admirável se levarmos em consideração a forma como ele aborda seu tema central que é, justamente, a terceira idade.

O longa traz um grupo de idosos que, atraídos por um anúncio publicitário de um hotel para a terceira idade, partem para a Índia. Lá, descobrem que o estabelecimento está caindo aos pedaços e que o anúncio não passava de uma estratégia do administrador, e um de seus donos, para reerguer o local. Nas condições mais adversas possíveis, o grupo começa a usar a experiência como uma forma de libertação de seus próprios conceitos sobre o que é correto ou não fazer no estágio da vida em que se encontram. O longa é dirigido por John Madden, diretor que depois de ganhar o Oscar com Shakespeare Apaixonado em 1998 não conseguiu justificar sua premiação, sendo responsável também por equívocos como O Capitão Corelli e Killshot - Tiro Certo. O Exótico Hotel Marigold é, sem dúvidas, o maior acerto da carreira de Madden desde então. O longa é espirituoso, evita o melodrama e trata o tema com a precisão, respeito e reverência necessários. Claro que para isso, Madden conta com um elenco de cair o queixo e que se impõe logo no primeiro take que o diretor faz com todo ele reunido em um saguão de um aeroporto. Contudo, o maior mérito do longa, e isso Madden consegue muito bem, é explorar a dramaticidade que consiste no fato de que estes personagens travam árduas batalhas entre seus próprios anseios e as convenções que involuntariamente assimilam sobre os limites da realização de seus desejos na velhice. Incrível como uma perspectiva tão cheia de possibilidades e rica é pouco explorada no cinema.

Voltando ao elenco, os acertos começam com o fio condutor do longa, Judi Dench está, como de praxe, excelente. A atriz, conhecida mais por suas participações na série 007 como M do que por seus trabalhos em Íris, Sua Majestade Mrs Brown (também do Madden) e Notas sobre um Escândalo, encabeça o elenco como uma digna leading lady com dilemas que parecem extraídos de um romance de Jane Austen. E, claro, Dench lida com todos os conflitos de sua personagem com uma precisão absurda. Tom Wilkinson também é uma das grandes presenças do filme na pele de um juiz que parte para a Índia com uma missão específica (mais do que isso não posso revelar pois estragaria a apreciação do filme). O ator divide uma das cenas mais emocionantes do longa com Dame Judi Dench. Penelope Wilton também merece destaque na pele de uma mulher casada em crise com seu marido, interpretado por Bill Nighy, e que cogita a infidelidade como forma de sair da incompatibilidade silenciosa que se tornou seu matrimônio. Além deles, também cumprem com êxito seus personagens Celia Imrie e Ronald Pickup, os únicos do grupo que, entre outros objetivos, querem encontrar um parceiro no país.  Mas é claro que Maggie Smith puxa para si todas as atenções com a preconceituosa Muriel Donnelly, uma senhora que só aceita viajar para a Índia porque precisa desesperadamente realizar uma cirurgia que só pode ser feita lá, o problema é que ela é cheia de restrições com culturas estrangeiras. O choque de Donnelly no país proporciona momentos hilários e a personagem vai avaliando seus próprios conceitos sobre a vida. Acompanhar esta mudança na percepção e no espírito da personagem pelo olhar de Maggie Smith é um privilégio.

É uma pena que O Exótico Hotel Marigold não deslanche com o potencial que tem para deslanchar por conta de um desvio de atenção provocado equivocadamente pela inserção do núcleo dos indianos, encabeçado por Dev Patel. Não há espaço no filme para discussões culturais que não sejam guiadas pelos olhares de seus protagonistas. Motivado pelo sucesso de Quem quer ser um Milionário? no Oscar de 2008, John Madden parece querer dar para Patel e seu núcleo um destaque que não cabe no filme e destoa de toda a proposta do longa. O foco aqui são os personagens estrangeiros e como eles vão lidando com seus próprios conceitos sobre a vida em um país que na perspectiva deles é inóspito (e isso é reforçado pela condução de John Madden, não se trata de uma visão preconceituosa da Índia, mas de dar saliência ao olhar que o grupo de personagens tem sobre aquele país). Uma pena que Madden tenha se distraído com Dev Patel - uma interpretação desastrosamente estridente, diga-se de passagem - por um momento e tenha se esquecido de que tinha em mãos um elenco dos sonhos para qualquer diretor, sem exagero algum. Ainda assim, o que fica de O Exótico Hotel Marigold são os méritos de seu maestro de reunir estas figuras espetaculares e de retratar uma fase inevitável de nossas vidas sem ingenuidade (todos os problemas estão lá), mas com doçura, respeito e humor, britânico.


The Best Exotic Marigold Hotel, 2012. Dir.: John Madden. Roteiro: Ol Parker. Elenco: Judi Dench, Tom Wilkinson, Bill Nighy, Maggie Smith, Penelope Wilson, Ronald Pickup, Celia Imrie, Dev Patel, Tena Desae, Lillete Dubey, Hugh Dickinson, Lucy Robinson. 124 min. Fox.

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Chovendo Sapos: O Exótico Hotel Marigold
O Exótico Hotel Marigold
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