Jean Dujardin entregando-se ao melancólico declínio do astro do cinema mudo George Valentin em O Artista. |
Mesclando nostalgia e metalinguagem, O Artista é um impecável exercício de estilo do diretor Michel Hazanavicius. No entanto, o longa não cai no equívoco de empregar uma técnica narrativa e esquecer de arrebatar o público com uma história emocionalmente completa. Utilizando uma fotografia em preto e branco e a ausênia do diálogo - o filme é mudo -, características marcantes do cinema na Hollywood dos anos de 1920, O Artista conta a história de George Valentin, um ator consagrado na era de ouro dos filmes sem som que entra em desgraça ao constatar que já não serve mais a uma indústria que começa a conhecer as produções cinematográficas faladas. Nesta transição, ocorrida por volta de 1929, Valentin conhece Peppy Miller, uma aspirante a atriz que tem uma ascensão em sua carreira graças a George. Ela se torna a nova cara da Hollywood dos novos tempos, a queridinha de um dos grandes estúdios da época. Ele, o decadente astro de filmes mudos.
Antes de se mostrar como uma apaixonante carta de amor ao cinema, O Artista é um filme que fala sobre transições, os entraves que marcam uma disputa equivocada entre a tradição e a modernidade. A união entre os dois universos acaba mostrando-se como a alternativa pacificadora de um processo que quase leva Valentin à desgraça. Hazanavicius conduz com segurança as trajetórias descompassadas de Valentin e Miller. Toda a narrativa de O Artista é fluida, atestando o que mestres da ausência de som como John Gilbert, Charlie Chaplin e Douglas Fairbanks já tinham mais que comprovado com obras que permanecem relevantes pela pertinência de suas histórias e pela carga emocional que transmitem: muitas vezes, a mágica da tela grande não está na voz, pode se esconder em um simples olhar, gesto ou mesmo em um número de sapateado.
O Artista ganha a plateia por não ser meramente metalinguístico ou estar à serviço da nostalgia de um grupo restrito de cinéfilos, mas por transmitir variadas emoções com uma sinceridade que conquista desde o primeiro momento em que Jean Dujardin entra em cena. Falando nele, o ator é reponsável pela alma do filme. Apropriando-se da linguagem e das técnicas de interpretação da época como ninguém, Dujardin compõe em George Valentin uma figura charmosa, trágica e apaixonante em cena. Praticamente não estabelecendo distinções entre o homem Valentin e suas aparições na telona, Dujardin compõe os traços da típica estrela de Hollywood da época, quando era difícil vislumbrar a cortina que dividia o espetáculo da amargura e secura da vida pessoal. Um trabalho absolutamente fascinante. Assim como Berenice Bejo, que assume características semelhantes de técnica de interpretação para transformar Peppy Miller em um interessante contraponto a George Valentin.
Contando com a participação de um elenco de peso em participações pontuais, como John Goodman, Penelope Ann Miller, James Cromwell e Malcolm MacDowell, O Artista nos faz lembrar porque somos apaixonados há tantos anos pelo cinema. Hazanavicius pode até não atingir o sublime para alguns, nem acredito que as pretensões sejam estas, mas ao tornar este longa um tiro certeiro no coração dos apaixonados pela sétima arte, o diretor conquista a todos com muita simplicidade e talento resgatando signos técnicos e artísticos do passado em prol de um irresistível resgate cinematográfico. Irresistível.
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